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Ais

A imagem da torre de Belém rodeada de verde, um relvado imaculado à frente dos Jerónimos ou o areal da praia da Rocha às listas relvadas não me sai da cabeça. A contrastar com os canteiros abandonados, nunca semeados, que à porta de casa encontro todos os dias. Parece que o País tem duas dimensões. A da imagem e a da realidade. Por um lado temos estádios novos, em folha, cheios de cadeiras a estrear. No reverso temos campos pelados, quando os há, onde a malta para jogar tem que improvisar balizas. De um lado temos as campanhas da Galp, da PT e da TMN a oferecerem bilhetes para os jogos em troca da compra de produtos e de sorteios entre consumidores da marca, do outro, temos a ideia de que ninguém ao nosso lado tem bilhete para ir ver jogos do Euro. De um lado temos o terrorismo a nível internacional a pedir medidas extraordinárias de segurança, do outro temos forças policiais a agirem com métodos e instrumentos obsoletos, a agarrarem invasores ao mesmo tempo que seguram no chapéu. De um lado temos o Governo a dizer que esta é uma grande oportunidade de aproveitar o filão turístico e ajudar o País a sair do buraco, do outro lado vemos incipientes acções de propaganda turística (no caso do distrito da Guarda resumem-se a um pórtico em Vilar Formoso – só escrito em Inglês, quando a maioria dos passantes devem ser de nacionalidade Espanhola, Francesa ou Alemã – e a um ou outro folheto informativo, muito pobrezinho, que não dá a mínima ideia dos principais atributos da região, aldeias históricas e Serra da Estrela). De um lado temos um Seleccionador, campeão mundial em título, que garante como mínimo uma presença nas meias-finais da prova, do outro temos a evidência de uma série de maus resultados em repetidos ensaios falhados que fazem desanimar os adeptos e arrefecer o entusiasmo de apoio à equipa que deveria ser de todos mas que parece ser de um só. De um lado temos a certeza de os nossos jogadores representarem uma geração de ouro, à procura de acabar em beleza o que tão brilhantemente começou (a conquista de dois títulos consecutivos nos mundiais de Juniores), do outro temos a experiência do fracasso do mundial da Coreia e a desilusão do Europeu de França (a somar às atitudes de pouco fair-play demonstradas pelos jogadores nessas competições).

De um lado temos um País envolvido numa tarefa imensa de mostrar ao mundo aquilo de que é capaz, do outro temos a sensação de que o nosso futebol está gravemente doente, tantos são os casos de corrupção, e de jogadas escuras que têm vindo ultimamente a público.

Por tudo isto, embora gostasse de partilhar do optimismo, tão em voga na campanha publicitária do Euro, e exemplarmente interpretado pela canção dos “menos ais”, de que por acaso até gosto, a verdade é que a diferença entre a realidade e a ficção só me leva a dizer Ai, Ai!

Por: Fernando Badana

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