P – Qual o balanço destes 25 anos de O INTERIOR?
R – Nos 500 anos do nascimento de Camões, e porque a língua é a matéria-prima de um jornal porque é a primeira forma de comunicar com o leitor, celebramos um quarto de século com a certeza que valeu a pena dedicar 25 anos a fazer este jornal. Foram 25 anos a dar força às palavras, a escrever boas notícias, a informar e a contribuir para uma sociedade mais esclarecida e informada. Foram 25 anos intensos e profícuos, de muito trabalho e dedicação, de profissionalismo e seriedade, de rigor e liberdade. Foram 25 anos a trabalhar para uma comunidade mais equitativa, mais culta e mais desenvolvida. Nem sempre conseguimos fazer como queríamos ou devíamos, mas fizemos sempre o melhor que podíamos e sabíamos, sempre numa relação de confiança com os nossos leitores – os leitores são a razão de ser de um jornal, e acredito que os nossos confiam e sempre confiaram no nosso trabalho, no nosso vigor e na nossa entrega ao jornalismo e à região. O balanço é muito positivo: afirmámos nesta região um projeto editorial de referência, moderno e respeitado. O maior e mais importante jornal do distrito da Guarda. Nascemos com a intenção de “mudar o interior” e de dar “uma nova visão do interior”, não há dúvidas que o conseguimos, ainda que outros possam não o perceber ou não concordar. Um jornal também é isso: viver de ruturas, de cortes, mudanças e conflitos, de desagradar a uns, para informar ou escrutinar, e não viver de unanimismo. O INTERIOR tem sido isso, e por isso formos distinguidos pela Comissão das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril pelo nosso contributo para a democracia.
P – O que ficou por concretizar?
R – Como em todos os projetos, tivemos muitas vezes de nos adaptar ao contexto, sem tergiversar no que eram os pressupostos editoriais, nos princípios e valores, mas adequando a nossa linha editorial e o trabalho à conjuntura e ao meio em que estamos. Houve muitas ideias de que fomos desistindo e houve propósitos que não pudemos atingir. Sempre acreditei que um jornal poderia ser motor de desenvolvimento regional, pela influência, pelo debate de ideias ou pela pressão sobre os atores políticos. Defendi sempre, por exemplo, um “plano Marshall” e um plano fiscal para o interior que contrariasse o abandono a que os territórios de baixa densidade há muito estão votados. Infelizmente, não consegui impor esse desígnio, nem consegui que os políticos me ouvissem…
P – No ano 2000 augurava-se que o futuro dos jornais em papel estava ameaçado, 25 anos depois, é a própria comunicação social que está em risco. Quem a pode salvar?
R – Os cidadãos, quando despertarem para a necessidade de ter informação de confiança, escrutínio dos poderes e sentirem que alguns valores essenciais na sua vida são postos em causa sem imprensa ou sem uma comunicação social independente, sem um jornalismo sério e rigoroso – e um jornalismo sério e rigoroso quase nunca é do agrado de todos. Há 25 anos havia seis ou sete jornais na Guarda. Hoje há dois. Há 25 anos havia algum jornal em quase todos os concelhos do país, hoje em quase 100 concelhos há um deserto de notícias, ou seja, não há nenhum tipo de informação local, de escrutínio, de divulgação do que se passa… Todos temos de meditar sobre esta realidade. E sobre o facto de os jornais serem o arquivo vivo da nossa comunidade, de serem a memória viva do que de mais importante ocorre nas nossas aldeias, vilas e cidades. E alguém tem de pagar esse arquivo, este serviço público e esta valorização da democracia e a liberdade. O digital pode ser uma oportunidade, ainda que não haja um modelo de negócio sustentável nos novos suportes. Mas oferecer conteúdos, informação, notícias, cultura tem de deixar de ser gratuito. As pessoas habituaram-se a que toda a informação seja gratuita, mas alguém tem de pagar a fatura e o salário de quem escreve e produz os conteúdos que todos lemos ou vemos nos tablets ou nos smartphones.
P – 25 anos depois, O INTERIOR tem futuro?
R – O futuro dos jornais depende dos leitores. E de quem os faz. O INTERIOR é um projeto editorial que faz jornalismo e vive do jornalismo. A sustentabilidade dos jornais é muito difícil. Os custos são cada vez mais altos e as receitas cada vez menores. Continuar é um caminho muito difícil, de devoção, muito trabalho, muitas contrariedades e muita dedicação. Mas é assim há 25 anos.
CARA A CARA, entrevista a Luís Baptista-Martins, diretor de O INTERIOR