Vae victis! (Ai dos vencidos!)

A frase «ainda há juízes em Berlim», tantas vezes repetida quando estamos perante diferentes interpretações da lei, remete para um caso famoso, descrito no conto “O Moleiro de Sans-Souci”, de François Andrieux, e a que não resisto recorrer a propósito da rejeição do juiz Almeida Costa para o Tribunal Constitucional. Rapidamente: Em 1745, na Prússia, um moleiro tinha o seu moinho nas proximidades do palácio do rei Frederico II. O soberano, um déspota esclarecido, sempre rodeado de intelectuais, influenciado por um conselheiro vaidoso, concluiu que o moinho maculava a paisagem e por isso quis expulsá-lo dali. O moleiro negou-se a sair e quando o rei o chamou para ouvir a sua versão, ele terá dito que «ainda há juízes em Berlim» a que recorrer, pois, para o moleiro, a Justiça com que contava teria de o tratar como cidadão com os mesmos direitos e deveres que Frederico II.

E mais do que isso, os juízes de um Tribunal Superior têm de ter o bom senso e a capacidade de perceber e saber ver todos por igual, sem distinguir classes sociais, credos, orientações sexuais ou ideológicas…

É isto que se espera dos juízes – e em especial de juízes de um tribunal superior, a capacidade de escrutínio, de decidirem com distanciamento e equilíbrio, de interpretarem e defenderem com equidade, probidade e igualdade. Foi isso que foi posto em causa no candidato Almeida Costa. A polémica sobre o candidato a juiz do Constitucional foi doutrinária, mas também foi de postura e falta de probidade. Este juiz não teve bom senso, equilíbrio e moderação, por isso não pode ter lugar no Palácio Ratton.

Em 1982 havia a intenção de dar ao Presidente da República a possibilidade de indicar três juízes. Devido a um conflito do PS e do PSD com Ramalho Eanes essa opção foi transformada em cooptação (os juízes escolhidos pela Assembleias da República – pelo PS e PSD – escolhem interpares mais três juízes). Uma decisão errada que deveria ser corrigida. Como sugeriu a constitucionalista Teresa Violante, os juízes do Constitucional deviam ser todos eleitos pelo Parlamento e, quando são escolhidos vários ao mesmo tempo, «deviam surgir em lista singular, para os deputados os poderem chumbar individualmente, se assim entenderem – e não em bloco». Em Democracia só pode ser assim, a responsabilidade das grandes opções tem de emanar do Parlamento; a responsabilização das escolhas tem de ser feita pelo escrutínio dos cidadãos, e esse escrutínio é feito politicamente, e apenas politicamente.

2. O PSD finalmente tem um novo presidente. Duvido que Luís Montenegro resista quatro anos a liderar a oposição a um governo de maioria absoluta. E duvido que tenha as condições e a capacidade para promover uma alternativa a António Costa, mas não tenho dúvidas sobre a necessidade que o país tem de um PSD capaz, dinâmico e renovado. A liderança de Rui Rio foi o pior que ocorreu ao partido e à política portuguesa. A maioria absoluta do PS foi o resultado do susto que milhares de portugueses sentiram quando viram sondagens que poderiam dar a vitória ao PSD em janeiro, baixando historicamente a abstenção e votando no PS para evitar a eleição de Rui Rio – o líder que será recordado pela sua luta contra o FC Porto, contra a cultura no Porto, contra a liberdade de imprensa e por ter um gato. O extraordinário é que, cinco meses depois de apresentar a demissão na sequência da derrota nas legislativas, Rui Rio ainda ocupe o palco do PSD e não se tenha retirado. Da herança de Rio, na Guarda, ficam a divisão do PSD (com derrota laranja nas eleições) e a escolha para deputado pelo distrito da Guarda de Gustavo Duarte que, durante mais de vinte anos, combateu o distrito defendendo a ligação contranatura de Foz Côa aos distritos de Vila Real e Bragança – um paradoxo -, de que a saúde foi apenas um exemplo. O novo presidente do PSD terá muito que fazer para recuperar o PSD como partido de poder e na Guarda terá de esclarecer se o partido quer reintegrar os prófugos que saíram com Sérgio Costa ou fazer oposição ao movimento Pela Guarda – e se quer ou pode recuperar o “filho pródigo” e agora presidente da Câmara da Guarda.

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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