Portugal é muito mais do que bola!

«também neste jornal queremos participar na consciencialização sobre a importância do combate à homofobia e a construção de uma sociedade livre, igualitária e sem preconceitos»

1. A seleção nacional, com todos os seus méritos e ganhos, caiu em Sevilha sem honra nem glória. Caiu porque a bola é redonda e para uns ganharem outros têm de perder – e uma seleção que foi formatada para defender dificilmente pode marcar golos, e na competição ganha quem marca, mesmo que sofra golos. Porém, seria bom recordar que a seleção nacional de futebol ao longo de dezenas de anos ficou sempre excluída das principais competições internacionais – este é o ciclo mais extraordinário da história do futebol português. E que a equipa de Eusébio (e dos “magriços”, em 1966, foi a única que conseguiu ir a uma fase final de um campeonato do mundo durante o século XX – Saltillo ainda serviu para o circo ir ao México onde fomos eliminados por Marrocos em 1986…). Ou seja, a seleção nacional distinguiu-se internacionalmente apenas nos últimos 20 anos – até fomos campeões da Europa. E se estamos hoje entre os melhores do mundo, graças a Ronaldo & Cª, no que é um desempenho notável em si mesmo, vermos os principais magistrados da nação de cócoras pelo feitos da seleção nacional de futebol é do mais ridículo a que podemos assistir.
Ouvir o Presidente da República defender que o foco do país tem de estar com a seleção; ou deixar tudo para estar no triste regresso… é a liderança do país a não saber dar o exemplo. E ainda mais indigente foi a forma como o Presidente da Assembleia da República repetiu o «até Sevilha».
Às elites e aos mais importantes representantes do Estado devemos exigir elevação e bom senso. A exibição populista e patética de apoio à seleção foi um mau serviço público que o país dispensava e o futebol não precisa.

2. Cerca de 10 por cento das câmaras municipais portuguesas foram sempre governadas pelo mesmo partido. São 31 autarquias que, entre socialistas (11), social-democratas (11) e comunistas (9), elegeram sempre o mesmo partido e, provavelmente, só não elegeram sempre o mesmo presidente da câmara porque a lei de limitação de mandato impõe 12 anos (três mandatos) como limite. Muitos mudam o presidente, mas fica a mesma equipa, e por vezes o mesmo líder a mandar nos “bastidores”. São os dinossauros deste país, em concelhos onde o debate público é inexistente ou muito reduzido. Onde, também, há mérito de quem governa e demérito da oposição, que não sabe ou não pode promover uma via alternativa. E há os que regressam, como João Mourato, na Mêda, que foi presidente de Câmara entre 1985 e 2009. Ou Fernando Ruas, que liderou em Viseu entre 1989 e 2013. Ou aproveitam as nuances e interpretações da lei («de Câmara» ou «da Câmara»), como Álvaro Amaro, que depois de 12 anos à frente da Câmara de Gouveia, foi eleito na Guarda em 2013 e 2017. Ou de João Prata, que depois de esgotar os mandatos na freguesia de S. Miguel aproveitou o reordenamento das freguesias para ser o eleito na freguesia da Guarda há oito anos (e candidato a mais um mandato nas próximas autárquicas), correndo o risco de ser presidente de junta por mais de 20 anos. Em democracia é natural que os cidadãos escolham manter a sua confiança no mesmo partido ou no mesmo dirigente eleição após eleição. Mas não podemos deixar de suspeitar que, nas autarquias onde governa sempre o mesmo partido, se cristalizem hábitos e clientelas, redes de interesses e poderes, que impedem a alternância democrática. O saldo do poder local é claramente positivo, no que concerne à execução de projetos, investimentos ou satisfação das necessidades da população local. Mas a renovação das elites políticas e a alternância democrática é uma necessidade democrática.

PS: O Dia Internacional do Orgulho Gay é comemorado anualmente dia 28 de junho. Num ano em que a pressão do Governo iliberal húngaro se impôs à UEFA, impedindo que um estádio em Munique fosse iluminado pelas cores do movimento LGBTI; num momento que o Governo português de António Costa escolheu uma suposta “neutralidade” para não afrontar Viktor Orban e outros inimigos da liberdade, também neste jornal queremos participar na consciencialização sobre a importância do combate à homofobia e a construção de uma sociedade livre, igualitária e sem preconceitos.

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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