A Guarda, de coordenadas 40032’ N e 7015’ O e com a sua Torre de Menagem a 1.056m acima do nível do mar, está situada nas bordeiras da Serra mais alta, a Estrela, outrora Montes Hermínios Maiores, continuidade geográfica mais ocidental da Cordilheira Central Ibérica.
As linhas de água, fonte de vida, as zonas montanhosas, defensivas, e a rocha prenhe de minérios, fazem desta região uma área de comprovada ancestralidade humana.
Como cidade de foral, é uma das mais antigas do país, lá do alto dos seus oito séculos, mas a história humana é muito anterior e remonta aos tempos idos do Paleolítico, há pelo menos 100.000 anos.
Muito mais tarde, com a chegada dos romanos e da sua tecnologia mineira, fica claro que toda a região ainda reserva enorme valor económico, pela exploração de minerais valiosos, como ouro, prata e estanho, entre outros, durante mais de três séculos.
Desde a ocupação romana, passando pelo período medieval, estratégico para as fronteiras do país, até à atualidade, a Guarda somou pontos e importância.
Chegados à atualidade, e em jeito de balanço, constatamos que a cidade tem:
– autoestradas e linhas ferroviárias, em redes, nacionais e internacionais;
– equidistância de Lisboa e Madrid;
– vários aeroportos internacionais a pouco mais de 2h de viagem;
– uma barragem que garante o abastecimento de água de qualidade à região e ainda a produção de energia elétrica;
– um significativo parque eólico;
– várias escolas e uma instituição de ensino superior com créditos reconhecidos;
– uma chancela UNESCO com o Geoparque Estrela;
– a confluência das 3 maiores bacias hidrográficas do país (Douro, Tejo e Mondego), fornecendo 2/3 da água que é consumida em Portugal;
– empresas tecnológicas de elevada relevância mundial;
– um bom Parque de Saúde com origem no maior e mais importante Sanatório que o país teve, ligado ao tratamento de doenças respiratórias;
– um património único, material e imaterial, da indústria de lanifícios;
– iguarias gastronómicas com os sabores e qualidade de sempre;
– ar puro, saudável e fresco
– ecossistemas de altitude com endemismos que atestam uma biodiversidade exclusiva no mundo;
– região demarcada de magníficos vinhos diferenciados, em solos graníticos e de altitude, com crescente expressão nos mercados;
– um Teatro Municipal com uma agenda cultural fabulosa e transfronteiriça, superada apenas por Lisboa e Porto;
– várias companhias de teatro e grupos culturais;
– praias fluviais e empresas de desportos radicais;
– todos os serviços públicos e privados que qualquer capital de distrito tem;
– etc etc etc
Afinal, pergunto eu, o que falta à Guarda?
Na minha opinião:
Falta, da parte dos cidadãos, orgulho pelo que temos e somos.
Falta, da parte dos governantes, uma visão política estratégica de desenvolvimento moderno e sustentável.
E falta ambição, muita ambição.
Se Magritte tivesse conhecido esta cidade, não teria representado nesta sua magnífica obra, símbolo icónico do surrealismo, um qualquer castelo dos Pirinéus, a levitar neste enorme pedregulho.
Certamente não teria resistido ao deslumbramento da Sé Catedral da Guarda, e hoje a cidade estaria nas sete bocas do mundo a voar neste enorme bloco granítico.
Mas desculpando Magritte pela sua enorme lacuna, resta-nos a esperança de que, quem vai ao leme, transborde de inteligência, astúcia e ambição suficientes para conduzir esta cidade nas asas do progresso e do desenvolvimento sustentável, preservando sempre a sua história ancestral, os seus valores e saberes.
Parabéns ainda ao jornal O INTERIOR no seu 21º aniversário e honras lhe sejam feitas pela sua enorme importância na divulgação e promoção da região ao longo deste tempo e por alimentar a esperança do desenvolvimento que todos almejamos.
* Professora e colaboradora de O INTERIOR
Sobre a foto:
Ideia: Elsa Salzedas; adaptação da obra de Magritte, “Le Château des Pyrénées” (1961)
Fotografia da Sé com Rei: André Salzedas Adaixo
Montagem: Pedro Salzedas Adaixo