Explorados e Mal Pagos

Escrito por António Ferreira

“(…) ganhamos pouco, pagamos muito caro por serviços e produtos essenciais, estamos endividados e não conseguimos libertar-nos da armadilha do crédito, para além de não nos darem incentivos a poupar.”

Os combustíveis são mais caros em Portugal que na generalidade dos países europeus (na Roménia, a gasolina estava a €1,309 e o gasóleo a €1.308). Os nossos preços estão no terço superior e não há sinal de baixarem. Uma das razões é o IVA: temos uma das taxas padrão mais altas da União Europeia, apenas atrás da Croácia, da Dinamarca, da Eslovénia, da Finlândia, da Grécia e da Hungria (na Roménia é 19%). O preço do quilowatt/hora está alinhado com a média dos 27 países da União Europeia, mas se acrescentarmos impostos e taxas passa a ser o nono mais caro. A Internet no telemóvel é a segunda mais cara da União e no resto da nossa fatura de telecomunicações pagamos também dos preços mais altos.
Quanto a salários (valores líquidos, após impostos), estamos em 26º na Europa. Desta vez, temos atrás de nós a Roménia e a generalidade dos países europeus não integrantes da União. No crédito não estamos muito bem: os juros que os bancos nos pagam por depósitos a prazo são menos de metade do que nos pagariam na maior parte dos países da União. Os incentivos à poupança não são muitos, sobretudo quando a inflação passou a ser um problema grave. Os juros pagos nos empréstimos à habitação tiveram agora e vão continuar a ter agravamentos, mais graves em Portugal, em que as taxas variáveis predominam.
Há outros indicadores, mas menos preocupantes do que a perceção geral sobre eles: temos menos funcionários públicos, em média, que na União a 27 (15% da população ativa contra 16%), e a nossa carga fiscal nem é das mais altas nem é superior à média.
Em resumo: ganhamos pouco, pagamos muito caro por serviços e produtos essenciais, estamos endividados e não conseguimos libertar-nos da armadilha do crédito, para além de não nos darem incentivos a poupar.
Em tudo isto, como em muitas mais coisas, a perceção do observador prevalece muitas vezes sobre uma análise mais precisa dos factos. Quando circulamos na autoestrada e verificamos os preços anunciados para os combustíveis pelas várias concessionárias, é difícil não pensar que os preços estão combinados ou então que há enormes coincidências, dia após dia após dia. É provável que seja só a concorrência a funcionar e que os preços acabem por se ajustar uns aos outros depois de cada alteração, mas a verdade é sempre que me lembro de olhar verifico que os preços são idênticos, ao cêntimo ou à décima de cêntimo. O mesmo nas taxas de juro e nos preços dos produtos alimentares, que divergem por poucos cêntimos entre as várias cadeias de distribuição (e se tornassem públicos os preços pagos aos produtores, o escândalo seria ainda maior).
A solução para estas distorções passaria por um melhor trabalho das entidades reguladoras e dos instrumentos de que o Estado dispõe para intervir no mercado. A Caixa Geral de Depósitos é um deles. Se noutros países da União se pagam taxas de 2,2% pelos depósitos a prazo, porque não sobe a Caixa as suas próprias taxas, arrastando atrás de si o resto do mercado? As coimas por violação das regras da concorrência são pesadas e já tivemos notícia da sua aplicação, mas isso parece não chegar.
Uma boa maneira de se melhorar a perceção geral sobre o que as grandes empresas estão a fazer aos portugueses seria, por exemplo, a criação de um portal público em que os preços de produtos e serviços fossem obrigatoriamente introduzidos e pudessem ser comparados. Seriam mais evidentes as distorções e o que não ganhássemos nós em melhores ofertas, perdiam eles em exposição pública e vergonha.

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António Ferreira

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