Queríamos que o fatídico 2020 acabasse, mas bastaram uns dias do novo ano para estarmos de cara virada a 2021 – é que as perspetivas não são agradáveis.
1. A pandemia da Covid-19. Será um problema global, mas é também uma agrura nacional, já que, diariamente, bate recordes no número de mortos e infetados. É a consequência de decisões erráticas, adotadas mais em função do que diziam as empresas de sondagens do que, propriamente, defendiam os especialistas de saúde pública. Em março tínhamos a desculpa de termos sido apanhados de surpresa pela dimensão desta pandemia. Mas agora não se compreende a impreparação para enfrentar o Inverno, a segunda, a terceira vaga… as que vierem. Nota negativa para um governo sem planeamento eficaz que fará deste novo ano um tempo de luto. Mas a pandemia na saúde é o pandemónio na economia. Um país a travar a quatro rodas é um choque brutal, não há airbag que alivie as consequências. Pode o governo falar em apoios económicos, mas sabemos que 2021 vai arrastar a maioria das empresas para a linha vermelha. O que o Governo não gastou em prevenção e testagem massiva vai gastar nos hospitais, na Segurança Social, na reanimação desesperada da economia… tirem as vossas conclusões. Mas como em Portugal não temos Trump nem Bolsonaro, a culpa é do povo e das novas estirpes do vírus. E já agora, pergunto: e as empresas que já estavam mal, como ficam? E as regiões que já estavam deprimidas, que podem esperar?
Como dizia a minha avó: quando os gordos emagrecem, os magros… desaparecem. O que vai desaparecer em 2021?
2. Reelegemos um Presidente da República. Uns na esperança de que seja igual a ele mesmo. Outros na esperança que seja diferente. Outros por que não tinham uma alternativa válida. Na verdade, só ele era candidato ao cargo, os outros… eram outra coisa. A vitalidade da nossa Democracia também se mede pela qualidade dos candidatos ao mais alto cargo da nação. Olhando para o boletim de voto, percebemos como é rasteiro o mínimo denominador comum. E se a muitos preocupa um candidato que teve meio milhão de votos, mais nos deveria preocupar os seis milhões que (por muitas razões) não votaram. Isto da abstenção é conversa para uma noite, depois tudo se esquece e não mais se fala. Lamentável.
(Nota: a TVI interrompeu o discurso do vencedor presidencial para ir de urgência… para a “gala” do “Big Brother”. Isto explica muita coisa.)
Já temos tantos anos de pseudodemocracia como de ditadura, e é só isto que temos para oferecer?
3. A fatalidade. Deve ser a nossa tradição judaico-cristã que nos leva a aceitar as coisas como um desígnio superior, perante o qual nada podemos fazer. Sempre ajuda a alijar responsabilidades e a ter um reconforto na consciência pesada. Somos do Interior – fatalismo. Temos uma economia fraca – fatalismo. Estes são os partidos e a classe política que temos – fatalismo. E como fatalismo que é não vale a pena mudar. Votamos nos mesmos porque são todos iguais, e tudo fica igual porque é mais do mesmo. Este estado letárgico é que nos mata. Mas a verdade não é assim. No interior, há concelhos desenvolvidos. No interior há empresas fortes. O que faz a diferença são as pessoas, os líderes – uns são e outros não. E isso faz a diferença. Por exemplo, olhando de longe, vemos a dinâmica do Fundão. A Covilhã parece uma freguesia do Fundão, quando é a Covilhã que tem uma universidade, uma indústria, uma economia rural, um hospital universitário, uma entrada para a Serra de Estrela… Em 2021, teremos eleições autárquicas, e quem quiser votar nos mesmos terá o mesmo de sempre. Quem não for fatalista poderá procurar novas alternativas. Toda a nossa região merecia uma lufada de ar fresco, sobretudo num contexto crítico, são precisos novos rostos e novas dinâmicas.
João Morgado
Escritor
N.R.: João Morgado é o quinto convidado de O INTERIOR a partilhar a sua opinião sobre o novo ano, bem como as suas preocupações, aspirações e anseios.