Cara a Cara

«Tem faltado a vontade de quem pode decidir e viabilizar um Museu da Rádio»

Escrito por Luís Martins

P – A Rádio Altitude fez 75 anos. Como se explica esta longevidade?

R – Desde logo por ter sido um projeto pensado numa atitude de solidariedade, inicialmente com os internados no Sanatório Sousa Martins e depois com a cidade/região. A sua matriz beirã, a empatia (recíproca) entre a rádio e a comunidade foram muito importantes. Depois pelo facto de a Rádio Altitude ter contado com pessoas idóneas, entusiastas, de diferentes formações profissionais, empenhadas num verdadeiro serviço público e conscientes da função de uma emissora de radiodifusão sonora, sobretudo num específico contexto geográfico, social, cultural e económico. A Rádio, não o esqueçamos, é o somatório de muitos e valiosos contributos, alguns sem terem tido a justa visibilidade, mas nem por isso menos importantes para a sua progressiva evolução e robustecimento dos laços afetivos com ouvintes, anunciantes, instituições.

P – Tem defendido a criação de um Museu da Rádio, o que tem faltado para a concretizar?

R – Tem faltado a vontade de quem pode decidir e viabilizar o espaço, os meios necessários para o efeito. O projeto que apresentei em 2002 – mais tarde publicado em “O Dever da Memória – uma rádio no Sanatório da Montanha – incidia na necessidade de criação de um espaço, sob a luz dos atuais conceitos da museologia, pensado em função do atual edifício. Recordo que, nessa altura, com a transferência de titularidade dos alvarás de OM e FM, estava previsto o abandono do edifício onde continuam instalados os estúdios desta emissora. Nesse contexto, a proposta ia no sentido de ali ser instalado um verdadeiro Rádio Museu que poderia ser visitado e fruído como uma emissora em plena atividade; nada melhor que a permanência dos antigos equipamentos, arquivos, vinis e material técnico no próprio local para uma melhor compreensão por parte dos visitantes. Assumindo-se como uma estrutura ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, o Museu da Rádio tinha (tem) por principal objetivo a inventariação, conservação, interpretação e divulgação dos equipamentos radiofónicos; constituindo-se como agente dinâmico da salvaguarda do património de uma emissora com um rico historial e catalisador de investigação. Como escrevi na época, a criação deste museu podia articular-se com outros, desejáveis e já defendidos, espaços museológicos a implantar no Parque da Saúde, relacionados com o antigo Sanatório Sousa Martins.

 P – 75 anos depois já se perdeu muito do espólio da rádio. O que é possível recuperar?

R – A sua contextualização física, os equipamentos, o antigo emissor, arquivos sonoros, testemunhos e memórias de antigos colaboradores, fotografias… Haja vontades…

P – Corre-se o risco desta história e memória se perder?

R – Sem dúvida. Até porque se as memórias das gerações mais ligadas à evolução da rádio não forem preservadas e transmitidas aos ouvintes atuais, e aos mais novos, resultará uma imagem muito ténue e pouco elucidativa do passado. Daí que, por várias vezes, tenha defendido a reinvenção da rádio e a criação de novas fórmulas de aproximação com os jovens, capazes de estabelecerem pontes seguras entre passado, presente e futuro. Por outro lado, não se pode esquecer a salvaguarda de arquivos sonoros e a conservação de equipamentos, muitos dos quais particularmente sensíveis às condições de humidade, luz, temperatura.

P – É o autor de uma peça de teatro dedicada à Rádio Altitude, que vai ser estreada em outubro no âmbito das comemorações dos 75 anos da emissora. O que pode desvendar sobre espetáculo?

R – A peça terá a sua estreia no próximo dia 21 de outubro, no grande auditório do TMG. Intitula-se “Guarda a nossa rádio” e, tendo subjacente a história da emissora guardense (à qual tenho uma ligação desde finais de 1975), é uma reflexão sobre o papel e a importância da rádio em geral, os seus desafios atuais, os seus bastidores; ao mesmo tempo representa uma homenagem aos pioneiros e a todos quantos com o seu trabalho contribuíram e contribuem para que a rádio continue a ser presença diária.

Perfil:

Helder Sequeira

Provedor do Ouvinte da Rádio Altitude e autor do livro/ tese de mestrado “O Dever da Memória – Uma Rádio no Sanatório da Montanha”.

Idade: 63

Naturalidade: Vela (Guarda)

Profissão: Técnico Superior

Currículo: Tem desenvolvido a sua atividade no âmbito do ensino, comunicação social, cultura e historiografia regional. Iniciou-se na rádio e no jornalismo em 1976; Foi correspondente do “Diário de Notícias”, diretor dos jornais “Notícias da Guarda”, “Guarda Press” e “Diário da Guarda”, tendo também dirigido a “Rádio Altitude”, onde é Provedor do Ouvinte desde 2007;

Colaborou com vários órgãos de informação; Colunista mensal de O INTERIOR; Editor do blogue “Correio da Guarda” e do podcast “Anotações”; Quadro superior do Politécnico da Guarda, tem publicados vários trabalhos na área da comunicação, historiografia regional e toponímia.

 

Livro preferido: “Cem Anos de Solidão” (Gabriel Garcia Márquez), “Estrela Polar” (Vergílio Ferreira) e “Felizmente Há Luar” (Luís de Sttau Monteiro), para referir apenas três.

Filme preferido: “Profissão: Repórter” (de Michelangelo Antonioni), “A Lista de Schindler” (Steven Spielberg), “A Intérprete” (Sydney Pollack), entre outros.

Hobbies: Fotografia, escrita, leituras, viagens.

Sobre o autor

Luís Martins

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