Cara a Cara

«O “Reflexo Imperfeito” tem tido um contributo incomensurável na divulgação da poesia»

Alex (2)
Escrito por Sofia Pereira

P – Na 100ª rubrica “Reflexo Imperfeito”, na Rádio Altitude, porque escolheu declamar “Urgentemente”, de Eugénio de Andrade?
R – No passado dia 29 de março, o programa “Reflexo Imperfeito” completou cem edições. Eugénio de Andrade é um dos poetas portugueses que mais aprecio. Conheço a sua vida e obra. O poema “Urgentemente” está ligado aos valores de Abril, sendo um hino à urgente construção e disseminação do amor, da amizade, da felicidade, da alegria, do sorriso, da fraternidade e da claridade. É essencial demolir, por serem discordantes com o amor, determinadas palavras. É relevante acabar com o silêncio, a solidão e a guerra, venerar a presença do outro e celebrar a paz e a harmonia. Eugénio de Andrade era um “artista da palavra”, conhecido como o poeta da «firmeza e exatidão da palavra».

P – Qual o critério para a escolha dos poemas que passam no Altitude?
R – A declamação é o oposto da leitura “mecânica”. Declamar é interpretar. É uma arte que precisa de técnicas de dicção e entoação, mas sobretudo de emoção. De modo a transmitir a mensagem e a provocar sentimentos nos ouvintes, é necessário que o declamador esteja ligado emocionalmente aos poemas. Sentir os poemas é o critério principal. A poesia transforma a sombra em luz, e provoca calafrios quentes e gestos honestos.

P – Qual o contributo que o “Reflexo Imperfeito” tem para a divulgação da poesia?
R – O contributo para a divulgação da poesia é incomensurável. O programa é alicerçado num conceito simples, mas que é apreciado por muitas pessoas. De salientar que a Rádio Altitude deu-me a confiança necessária para iniciar as “Oficinas de Declamação”. No presente ano letivo, e na qualidade de técnico do município da Guarda, oriento estas oficinas na Escola Carolina Beatriz Ângelo e no Estabelecimento Prisional da Guarda. No passado dia 8 de março fomos audazes e intrépidos, os alunos do 7ºE e 7ºF da Carolina Beatriz Ângelo, no âmbito da Oficina de Declamação “As Palavras que nos Beijam”, visitaram os estúdios da Rádio Altitude e o jornal O INTERIOR. A oficina teve início no mês de novembro do ano passado. Distribuí, de forma aleatória e sem conhecer os alunos, poemas de autores portugueses consagrados, poemas esses que já tinham sido declamados por mim no programa “Reflexo Imperfeito” do Altitude. Por vezes, nas salas de aula, temos alguns momentos de tensão, mas que são completamente e rapidamente ultrapassados pelos momentos de alegria e superação. Em algumas ocasiões profiro palavras duras e olho para alguns alunos de uma forma severa, mas na realidade trabalhamos e a evolução é mais do que evidente. No Estabelecimento Prisional da Guarda trabalho com cerca de 30 reclusos. Ainda não sei quando, mas vou levá-los ao Teatro Municipal da Guarda. Os participantes são fantásticos, estão bastante motivados e têm compromisso com a Oficina de Declamação “Livres na Prisão”. Estas oficinas são uma voz de compromisso, de confiança, de firmeza, de dedicação, de autoestima, de motivação e de sorrisos francos. Constituem autênticos espaços de revelação, de libertação e de superação, nos quais viajamos, corremos, saltamos, rimos, aplaudimos, caímos, levantamo-nos e trabalhamos.

P – Pretende integrar autores locais nas declamações? Quem?
R – Na verdade, já declamei poemas de autores locais no “Reflexo Imperfeito”. Poemas de Albino Bárbara, Américo Rodrigues, Beatriz Gonçalves, Emília Barbeira, José Monteiro e Maria Afonso, entre outros.

P – O programa deu origem a um grupo de intervenção cultural, como olha para o evoluir da rubrica?
R – É o cumprir de um sonho! O programa “Reflexo Imperfeito” acabou por dar origem ao Grupo de Intervenção Cultural da Guarda “Reflexo Imperfeito”, no qual se juntam a poesia, a música, as vozes, as teclas e as cordas. O grupo é constituído por Albino Bárbara, Alexandre Gonçalves, Daniel Lucas, Luís Baptista-Martins e Pedro Correia. Ao longo de 2023, e de forma a celebrar os 75 anos, a Rádio Altitude foi intrépida com iniciativas de enorme valor cultural. Ofereceu três espetáculos à cidade da Guarda e à região, dois no TMG e um nos claustros do Paço da Cultura, sempre com casa cheia. Dois desses espetáculos tiveram como cabeça de cartaz o Grupo de Intervenção Cultural “Reflexo Imperfeito”. Em 2024 vamos realizar vários espetáculos! A Rádio Altitude está apelativa, tendo uma programação diversificada que é acompanhada pelas novas tecnologias e pelos novos desafios, daí ser uma rádio global. O “podcast” acaba por eternizar e propagar os programas da Rádio Altitude, sendo que os mesmos ficam disponíveis a qualquer momento e em qualquer lugar.

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ALEXANDRE GONÇALVES

Poeta, autor da rubrica “Reflexo Imperfeito” na Rádio Altitude

Idade: 47 anos

Profissão: Técnico superior na Divisão de Educação, Intervenção Social e Juventude da Câmara da Guarda

Naturalidade: Aldeia do Bispo (Sabugal)

Currículo (resumido): Licenciatura em Relações Públicas e Pós-graduação em Reabilitação Patrimonial; Colaborador da Rádio Altitude e Rádio Fronteira; Colaborador dos jornais “Cinco Quinas”, “Portal da Beira” e “O Primeiro de Janeiro”; Vice-Presidente do Centro Cultural da Guarda; Membro do Grupo de Intervenção Cultural da Guarda “Reflexo Imperfeito”; Membro do Conselho Editorial da editora “Lugar da Palavra”; Escritor, com quatro livros publicados, representado em várias dezenas de antologias de poesia

Livro preferido: “O Filho do Pecado”, de Jerónimo Jermelo

Filme preferido: “Um Lugar Bem Longe Daqui”, de Olivia Newman

Hobbies: Declamar, escrever, fazer trabalho voluntário e cozinhar.

Sobre o autor

Sofia Pereira

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