Cara a Cara

«O teatro foi o veículo que me levou a esse ambiente de criação livre»

Pedro
Escrito por Efigénia Marques

P – Quem é e o que faz Pedro Leitão?
R – Quem sou… A entrevista começa logo com a pergunta que faço a mim próprio todos os dias. Talvez isso explique o porquê de estar há tanto tempo a tentar responder. Se responder do ponto de vista poético, roubarei Pessoa para dizer que não sou nada, mas tenho em mim todos os sonhos do mundo. Ironicamente, do ponto de vista objetivo sou uma pessoa – o que me leva a duvidar de mim próprio e da bondade da minha resposta, porque sabemos que as pessoas podem mentir e ser maliciosas e eu não passo disso – uma pessoa… O que faço… Invento respostas para fugir ao confronto com o vazio..

P – O que o levou a ser ator?
R – De forma cómica poderia dizer: a camionete. Mas não direi. Na verdade foi o impulso criativo – a necessidade constante de criar, num ambiente onde o limite fosse a imaginação. O Teatro, para mim, foi o veículo que levou a esse ambiente de criação livre. Afinal talvez camionete não seja tão errado assim – talvez o teatro apareça como uma camionete que em cada paragem abra as suas portas para um espaço novo onde o impulso criativo pode florescer e o erro não aparece como limitador da ação, mas antes como seu potenciador. Então concluindo, talvez tenha sido a vontade de viajar nessa camionete que me levou a ser ator (a participar no Teatro).

P – Interpreta António na peça “Guarda a Nossa Rádio”. Qual foi a parte mais difícil de representar Emílio Aragonez?
R – No fundo, a maior dificuldade esteve em conjugar todas as facetas que a personagem apresentava – saudades pela juventude sem com isso cair no saudosismo; mostrar a dificuldade de interagir com novas tecnologias ao mesmo tempo que não se desdenha e se reconhece o trabalho excecional da rádio em acompanhar a evolução dos tempos. Enfim, criar um certo conforto dentro desta dualidade que a personagem apresenta ao longo da peça, ao mesmo tempo que se constrói um ambiente de “vida na rádio”. Pelas simpáticas palavras do Sr. Aragonez no final da peça, as quais aproveito para agradecer, julgo que o objetivo foi cumprido.

P – O que o surpreendeu nesta figura incontornável da rádio e também na história da Rádio Altitude?
R – No Sr. Aragonez, o humor, a descontração, a genuinidade. A forma simples como fez uma plateia inteira rir com vontade, sem se preocupar em ser sério ou agradar, embora estivesse visivelmente comovido e agradado ele próprio. Por parte da Rádio Altitude, na pessoa de cada membro da equipa que pude conhecer, o amor e dedicação ao trabalho que realizam, bem patente que estava no texto da peça. Depois desta experiência tenho um renovado respeito e orgulho por esta Rádio, toda a sua equipa, e por todo o trabalho que desenvolvem.

P – Estreada a peça, acha viável haver novos espetáculos ou uma itinerância de “Guarda a Nossa Rádio”?
R – Do meu ponto de vista, a peça tem um cariz de celebração que vai sempre implicar que seja vivida com mais emoção na cidade da Guarda. Contudo, havendo vontade e disponibilidade, não vejo qualquer impedimento para que a peça possa circular. Seria uma ótima oportunidade e um desafio para toda a excelente equipa. Além disso, julgo que a peça está desenvolvida de tal forma que pode ser bem acolhida por outros públicos.

P – Que outros projetos tem em perspetiva?
R – Gostaria de levar à cena o mundo inteiro num grão de areia, mas os recursos à disposição ainda não permitem concretizar tal sonho. Assim, foco-me de momento em projetos mais concretizáveis. Neste momento está a criação da “Balada de Augusto Gil”, uma encenação para o Museu da Guarda que explora o tempo da infância. Tem estreia prevista para o dia 14/12 no Museu. Está também em fase de embrionária um projeto multidisciplinar, “Talvez Amanhã”, que parte da pergunta “Poderá o sonho sobreviver no silêncio?”. É um projeto de exploração de formas de comunicação verbal e não verbal, que tem por base a filosofia de Eduardo Lourenço e o imaginário poético de Manuel António Pina, e pretende culminar na apresentação de uma peça: “O Dia em que Choveu em S. Pedro de Rio Seco”.

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PEDRO LEITÃO

Idade: 30 anos

Profissão: Ator/dramaturgo/advogado

Naturalidade: Manteigas

Currículo (resumido): É mestre em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra; Foi jurista na CCDRC e investigador na área do Direito Ambiental; Foi membro da Assembleia Municipal de Manteigas e da Assembleia da CIMBSE entre 2017 e 2021; Exerce advocacia desde 2017, ano em que iniciou também o percurso no teatro; Colabora regularmente com a Associação Hereditas, Aquilo Teatro e Museu da Guarda; Dos seus trabalhos destaca-se a participação na peça “Guarda a Nossa Rádio” e “Hamlet vírgula MacBeth”, e a autoria dos textos do Julgamento do Galo 2023 e “Um Dia na Repartição”, vencedora do prémio Bolsa de Escrita Dramatúrgica (Público Reservado e Associação Apuro), e estreada em 2023 no TMG.

Livro preferido: “Siddartha”, de Herman Hess

Filme preferido: “O Labirinto do Fauno”, de Guillermo del Toro

Hobbies: No geral, estar vivo é o hobbie sem o qual não imagino a vida.

Sobre o autor

Efigénia Marques

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