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João Moreno

A recente notícia da morte de João Moreno veio reavivar recordações já meio perdidas da minha formação como estudante do ISEF (Instituto Superior de Educação Física). Quis a sorte (ou destino?) que a minha incursão pelo futebol da Briosa (no âmbito do seminário final de curso) fosse um trabalho sobre a mística academista. Relembro agora quem me acompanhou nas teses e investigações sobre a criação dessa mesma mística. João Moreno foi sempre paciente e disponível nas descobertas e aprofundamentos sobre o tema do meu estudo. O ano, deve ter sido o de 1985 ou lá por perto, mas quanto às nossas conversas, à mesa do café pequenino, mas bem situado, por estar no coração da cidade alta (mesmo em frente aos arcos da Universidade), essas perduram e perdurarão para sempre. Durante o tempo que as nossas conversas duraram, sempre me deu a impressão de estar perante um indivíduo de grande correcção, de um saber estar feito de experiência e de gosto por tudo o que dizia respeito ao futebol e em particular à Académica. Adivinhava-se na sua atitude e nas suas palavras um amor pelo clube que ajudara a crescer mas ao mesmo tempo um amor pela verdade desportiva e pela descoberta das relações que se tecem entre a sociedade e o clube desportivo. Não tenho a mínima dúvida que ao falar com João Moreno não se falava só de futebol mas do Desporto em geral.

Retenho na essência a facilidade e o à vontade com que João Moreno me contava os episódios que considerava marcantes na criação do espírito de grupo e de clube. Foi ele a primeira pessoa a alertar-me para as jogadas sujas que muitas vezes se fazem no chamado desporto-rei. Ele sabia que havia muitos dirigentes que com jogadas dessas ganhavam campeonatos e títulos. Ele sabia, mas não alinhava pelo diapasão. Ainda que tal implicasse não ganhar ou perder um determinado título, essa era a sua forma de estar. Correctíssima. Imaculada até, eu diria. Infelizmente nem todos têm a estirpe de João Moreno e hoje assistimos a deploráveis espectáculos em que tudo serve para se diminuir e espezinhar o adversário. Parece que tudo vale a pena desde que tal sirva para se ganhar. A lógica imperante é essa mesmo. Quem ganha é idolatrado, não importando a forma como se ganha. E o mais caricato de toda esta situação é pensar que este comportamento se generaliza nos nossos clubes. Como se se quisesse lutar com batoteiros através da batota. Parece ser esse o princípio. Combater com as mesmas armas que o adversário. Responde-se a uma provocação com outra ainda maior. No final o espectáculo é tão degradante como aquele a que assistimos há dias quando os dirigentes do Benfica e do FCP trocaram insultos e ofensas em directo. Mas que belo exemplo esses dirigentes deram a quantos fazem do futebol uma parte importante da ocupação dos seus tempos. Que dizer depois de determinados acontecimentos que se vão registando um pouco por todos os campos deste País? Penso em tudo isto e sei que com João Moreno tal não seria nunca possível. Com ele nem que a provocação fosse …. colocar um cadáver nos balneários da sua equipa. A sua reacção seria sempre racionalmente dirigida. Que falta nos fazes, João.

Por: Fernando Badana

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