Por causa da falta de sacerdotes, há cada vez mais homens ou mulheres, solteiros ou casados, que, sem as tradicionais batinas, celebram as cerimónias litúrgicas dominicais. Desde o Concílio Vaticano II que a Igreja abriu as portas a esta possibilidade, que dá preferência aos homens, mas, na prática, até há mais mulheres nas paróquias do concelho da Guarda.
«Hoje há poucos padres e os que há estão mal distribuídos», começa por dizer, timidamente, Armando Borrego, ministro extraordinário da Comunhão na Vela, no concelho da Guarda. No seu caso, tudo aconteceu por casualidade. Um dia o pároco da aldeia não pôde comparecer à eucaristia dominical e o seu assistente pastoral também não podia substitui-lo. «Não sabíamos o que fazer. Ou fechávamos as portas da igreja ou tentávamos remediar o sucedido. Como na ausência dos padres os fiéis leigos podem suprir algumas funções litúrgicas, e por ser uma emergência, acabei por fazer a celebração da Palavra», recorda, orgulhosamente. Actualmente, há dois ministros extraordinários da comunhão na Vela, ambos homens, «com formação e uma autorização do Bispo», sublinha Armando Borrego, um dos agraciados. Para este leigo casado, «basta ter uma grande formação cristã e muita fé» para a função. «Há quem diga que agora a hora é dos leigos e eu concordo, porque os padres não podem estar em tantas paróquias ao mesmo tempo», acrescenta, com mais confiança. No entanto, a adaptação nem sempre é fácil, pois «quando há mudanças há sempre rejeição», justifica o leigo.
Para o padre Jorge Colaço, pároco na Vela, esta ajuda é «uma mais valia, pois é impossível celebrar a eucaristia dominical nas nove paróquias que tenho». Na sua ausência nas celebrações dominicais, em cada uma delas há leigos que assumem «a Celebração da Palavra», explica. Assim, o pároco vai de quinze em quinze dias a cada paróquia, «o que já exige uma estrutura rígida em termos de organização de trabalho». Esta adaptação não foi fácil: «Sobretudo nas paróquias que estavam habituadas a terem todos os domingos o seu pároco, agora já se estão a acostumar, mas ainda há uma longa caminhada a fazer», considera Jorge Colaço. Os chamados missionários extraordinários da comunhão assumem um mandato próprio do bispo e o acto eucarístico destes leigos é visto como uma ajuda ao presbítero. No entanto, as próprias comunidades paroquiais são «pouco abertas à novidade», queixa-se o padre, cujos paroquianos continuam a exigir a sua presença, «como se fosse há 30 anos». Contudo, na sua opinião, a falta de padres é «mais surrealista do que real». É que para além da má distribuição do clero, pois há párocos com muitas paróquias e outros com poucas, há também os factores demográficos. O caso da Vela, por exemplo: «Há uns anos atrás havia quatro escolas cheias de crianças e hoje resta uma com 12 alunos», constata. Mas Jorge Colaço também não coloca de lado a crise de vocação. «Um dos grandes pecados desta sociedade é mesmo o individualismo e isso, naturalmente, afecta a opção profissional», conclui, adiantando mesmo que até pode haver «um certo egoísmo pastoral», pois «é mais fácil ter poucas paróquias».
Patrícia Correia