Aldeia Viçosa reencontrou-se com o seu passado ao evocar todos os presidentes da Junta de Freguesia desde 1939. Numa cerimónia emocionada e marcada pela saudade dos respectivos familiares, a aldeia do vale do Mondego, no concelho da Guarda, testemunhou domingo a sua gratidão e registou para a posteridade os nomes dos dez autarcas das últimas seis décadas, com destaque para José Almeida Tonico, impulsionador da mudança de nome da localidade que deixou de ser Porco desde 25 de Janeiro de 1939.
O dia foi então de festa em Aldeia Viçosa e até o porco esteve presente na feliz efeméride mas só mesmo assado no espeto, uma iguaria guardada para o final da tarde. Até lá, e guiada pela filarmónica de Freches, a população deambulou quase em romaria entre a sede da Junta, onde as fotografias dos antigos autarcas “vigiam” agora os actuais na sala de reuniões, local que acolhe ainda uma exposição fotográfica sobre o quotidiano da aldeia desde os anos 30 até à actualidade. A vasta comitiva rumou depois para a rua onde morou José Almeida Tonico, nome com que foi baptizada perante a emoção de dois dos seus filhos, para descer novamente em direcção ao jardim situado no Largo Dr. Alberto Dinis da Fonseca, junto à igreja matriz, onde foi descerrada uma placa comemorativa com os dez nomes de quem «deu o seu melhor para o bem estar e o desenvolvimento da freguesia», recordou Baltazar Lopes, actual presidente da Junta. A seu lado, Esmeraldo Carvalhinho, vereador da Câmara da Guarda, enalteceu esta homenagem e recordou que Aldeia Viçosa tem sido «o berço de gente muito importante na política e economia, não só local, como também nacional». As palmas selaram a parte oficial das cerimónias, veio depois um rancho minhoto e o tão esperado porco para que a festa ficasse completa numa terra também conhecida pela sua hospitalidade patente na tradição secular do Magusto da Velha em que se dão castanhas e vinho a quem quer que por ali passe no dia seguinte ao Natal.
Mas desta vez quem deu foi Laurentino Almeida, um dos filhos de José Almeida Tonico, que, como que a perpetuar um hábito da família em ajudar a sua terra natal, doou 5.000 mil euros a repartir pela Junta e o lar da terceira idade. Muito emocionado com a homenagem, o antigo empresário, ido de Aldeia Viçosa há mais de 50 anos, considerou o seu pai uma figura «notável». «Distinguiu-se porque trabalhava muito, infelizmente morreu muito cedo [no final da década de 60] senão ainda tinha feito mais coisas», garante, confidenciando ter-se «reencontrado» domingo com episódios da sua vida, algumas pessoas, o seu pai, mas também a sua mãe, «outra pessoa notável e generosa, que não sabia dizer não a ninguém e dava muita coisa porque na altura vivia-se muito pobremente», lembra. Quanto ao nome de Aldeia Viçosa, Laurentino Almeida junta-lhe outra versão, já que ainda hoje recorda os estudantes de Coimbra em cima de um dos autocarros «a gritarem “porco, porco!”». Terá sido a “gota de água” para José Tonico, cuja furgoneta utilizada no negócio do azeite já era alvo recorrente da chacota. «Ele ficou muito ofendido com tudo isso e decididamente mudou o nome da aldeia, mas primeiro mandou pintar os autocarros», diz. De então para cá, Aldeia Viçosa, assim chamada pelo «encanto e generosidade agrícola» do local, perdeu habitantes e deixou de ser uma comunidade auto-suficiente: «Antigamente havia todas as artes e profissões, os terrenos eram bem cultivados, agora já não há cá quem trabalhe. Naquela altura havia duas escolas, hoje há só uma e com poucas crianças», lamenta, confidenciando haver ainda muita gente da aldeia que vai pedir-lhe dinheiro ou ajuda. Pedidos a que tem procurado «acudir como sempre, pois ainda posso fazê-lo».
Luis Martins