O Governo decretou um segundo confinamento geral na sexta feira passada. Uma das medidas implementadas foi o teletrabalho obrigatório sempre que possível, mas existem áreas profissionais que têm obrigatoriamente de continuar a trabalhar presencialmente para assegurar os serviços indispensáveis à população. Desde o início da pandemia que alguns destes profissionais pouco alteraram o seu dia-a-dia de trabalho, além do cumprimento das regras impostas pela Direção-Geral da Saúde (DGS).
Tal como no primeiro confinamento, as pessoas continuam a açambarcar
Funcionária do Minipreço, na Guarda, Maria Santos tem consciência que a profissão que desempenha é essencial para as pessoas, uma vez que lhes garante bens de primeira necessidade. Porém, lamenta a desvalorização que alguns clientes têm pelo «imenso trabalho» que os trabalhadores os supermercados têm diariamente.
«Às vezes saímos às tantas da noite porque as pessoas, à semelhança do primeiro confinamento, continuam a açambarcar, mesmo não havendo essa necessidade», lamenta a jovem de 23 anos. Maria Santos confessa que o primeiro confinamento foi «muito esgotante» pela quantidade de pessoas que se dirigiam aos supermercados de forma descontrolada. «Trabalhávamos quatro dias seguidos e depois folgávamos outros quatro, foi muito desgastante», recorda a funcionária. No primeiro fim de semana deste segundo confinamento, o Minipreço da Guarda assistiu a uma crescente afluência de clientes, muitos dos quais sem tomarem os devidos cuidados: «Em vez de ir só uma pessoa do agregado familiar vai a família completa. E há pessoas que vão mais do que uma vez por dia às compras porque é o único motivo que encontram para sair de casa», adianta Maria Santos. Na sua opinião, a falta de fiscalização por parte das autoridades é uma das razões para este relaxamento. «As pessoas viram que no primeiro confinamento não existiu muito controlo, então agora aproveitam», acredita Maria Santos.
Somos de carne e osso e esta situação está a deixar-nos exaustos
Os hospitais portugueses, de forma geral, encontram-se à beira da rutura e a existência de profissionais de saúde que trabalham horas seguidas para assegurar os cuidados necessários para doentes Covid-19 ou com outras patologias é o que tem evitado esse colapso.
Renato Lopes tem 30 anos e é assistente operacional no Hospital Sousa Martins, na Guarda. «Presto apoio à equipa de enfermagem e ao utente em todas as suas necessidades», explica o funcionário da ULS. Apesar de todo o esforço que têm feito desde março, Renato Lopes sente que esse trabalho não é valorizado. «A generalidade das pessoas pensa que estamos lá para ganhar um ordenado, mas não é só por isso. Passa também por saber que a nossa função é ajudar pessoas que precisam de tratamento hospitalar», acrescenta. O primeiro confinamento foi «mais complicado» devido a ser algo desconhecido, pois «não estávamos habituados a uma coisa assim. É certo que não havia tanta gente, porque as pessoas tinham medo». Por isso, o assistente operacional deixa agora um conselho: «Mais vale ficar em casa do que vir parar ao hospital. Nós somos de carne e osso e esta situação está a deixar-nos exaustos», alerta.
Há dias em que somos as únicas pessoas que veem
Cláudia Santos é assistente de cozinha na Associação de Melhoramento, Cultura, Desporto e Recreativa de Santa Eufêmia, no concelho de Pinhel.
Esta Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) presta apoio domiciliário, nomeadamente a refeição, serviço de lavandaria, limpeza da habitação e auxílio na higiene pessoal de idosos. Trata-se de um tipo de cuidados que tem de ser feito, inevitavelmente, de forma presencial e constante, por isso, Cláudia Santos continua a trabalhar com o sentimento de dever cumprido: «Sinto-me uma privilegiada, porque na situação que estamos a passar é um privilégio conseguir manter os nossos locais de trabalho no ativo», considera. E o seu empenho é retribuído e valorizado pelos utentes a quem presta apoio domiciliário porque «eles sabem que somos a única companhia que têm e há dias em que somos mesmo as únicas pessoas que veem. Somos um ombro amigo nesta situação que estamos a atravessar», confessa, emocionada, a assistente de cozinha.
Residentes em Santa Eufêmia, A maioria dos utentes da associação «não tem bem noção da gravidade da situação», ou seja, têm uma vida sem grandes sobressaltos. O que se deve também ao facto de ainda não terem «existido casos de Covid na aldeia», adianta a funcionária de 26 anos.
O facto do cliente voltar sempre é um bom sinal
Fábio Aguiar considera que foram as pessoas mais idosas que resistiram «um pouco mais» às medidas implementadas pela DGS.
«As pessoas tiveram dificuldade em adaptar-se ao uso da máscara. Chegamos a um ponto em que tivemos de recusar a nossa venda ao domicílio para também nos podermos resguardar», confessa o chefe de loja na Padaria/Pastelaria J. Santos, em Trancoso. O jovem de 26 anos também ajuda na distribuição do pão ao domicílio, serviço que tem aumentado com o confinamento, e tenta proporcionar, «ao máximo, ao cliente todos os serviços que prestámos até agora». Sente que o seu trabalho é reconhecido e valorizado, pois «o cliente volta sempre, acho que isso é um bom sinal», admite.
Fábio Aguiar recorda que trabalhar durante o primeiro confinamento «era triste, porque as pessoas tinham mesmo medo nessa altura» e evitavam «ao máximo» o contacto direto. «Havia clientes a pedir-nos o fornecimento de sacas de farinha e faziam pão para um mês, já eram menos contactos que tinham», lembra.