Cara a Cara

«Temos que pensar muito bem no que queremos para a Guarda senão, daqui a três ou quatro anos, seremos meia dúzia de gatos pingados»

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Escrito por Sofia Pereira

P – Foi presidente da Associação Comercial da Guarda durante mais de 10 anos e é empresário no setor do turismo. Quando era dirigente associativo havia mais de 2 mil associados no distrito. Que memória guarda desse tempo?
R – Uma boa memória. Começou por ser a Associação Comercial da Guarda e passou a ser a Associação de Comércios e Serviços do Distrito da Guarda e era representativa do pequeno e médio comércio e serviços do distrito. Nessa altura a associação tinha bastantes projetos, juntamente com a Câmara Municipal, fomos os fundadores da ProRaia, por exemplo. Infelizmente, passados estes anos, a Associação deixou de existir – também devido à gestão desastrosa que se seguiu –, e é também um espelho de como a cidade está. Infelizmente, temos menos comércio na Guarda e poucas pequenas e médias empresas.

P – Tendo em conta que esteve fora da Guarda mais de 10 anos, como viu a região quando regressou?
R – Pior do que quando a deixei. Há uma debandada geral de população da Guarda para outras terras, portanto, isso vai-se refletindo no comércio, que não tem movimento e obrigatoriamente encerra. Tudo isto se deve às políticas nacionais e regionais que não conseguem estancar a saída das pessoas da Guarda. Os empresários que ainda se mantém por cá são uns autênticos heróis porque, de facto, viver onde não há gente, não há uma política para atrair pessoas e não há desenvolvimento económico, é muito difícil.

P – Nos Censos 2001 o concelho da Guarda ultrapassou, pela primeira vez, a barreira dos 44 mil habitantes. Pensava-se que o concelho ia continuar a crescer, mas foi ao contrário. Nos Censos de 2021 havia pouco mais de 40 mil habitantes. Como olha para esta realidade?
R – E vamos continuar a perder gente se as políticas regionais não se alterarem rapidamente. Infelizmente, o poder autárquico não tem conseguido desenvolver o concelho e não tem uma estratégia definida de futuro, nem para o presente. A estratégia do atual presidente da Câmara é uma estratégia pessoal, de fotografia e de mostrar aquilo que nunca fez e não vai fazer. Temos de pensar muito bem no que queremos para a Guarda senão, daqui a três ou quatro anos, seremos meia dúzia de gatos pingados. Temos que ter políticas para atrair pessoas, para atrair jovens. A nossa população está muito envelhecida.

P – A Câmara da Guarda comprou o edifício da Associação Comercial, que está devoluto, e neste momento há um projeto de requalificação em concurso público. Como olha para o futuro deste edifício que servirá para instalar o Comando Sub-regional das Beiras e Serra da Estrela da Proteção Civil?
R – Todas as situações que sejam para recuperar edifícios devolutos são boas. Acho que a Câmara está a comprar muitos imóveis e não tem projetos para esses edifícios todos. Se o projeto para a requalificação da antiga sede da ACG já foi lançado, penso que é uma boa ideia. O edifício está bem situado, tem um parque de estacionamento enorme e tem condições para albergar os serviços. Está no centro da cidade, no centro histórico, onde precisamos de gente e serviços. A Câmara da Guarda tem de ter uma definição para todos os edifícios que anda a comprar, que não são tão poucos quanto isso. E tem de pensar que a aposta nestes espaços é para atrair pessoas, não podem ser projetos que não digam nada a ninguém. A requalificação da Praça Velha foi um erro e passados estes anos ainda não houve um presidente que conseguisse dar a volta àquela situação. Temos que arranjar um programa para que o centro histórico da Guarda seja um centro histórico.

P – Atualmente tem uma empresa de animação turística, tem a noção do que é atrair os turistas e de contactar com eles. Como vê o setor na Guarda?
R – A Guarda não chama, e as pessoas que vêm dormem uma noite ou fazem os passadiços e vão embora. Vão à catedral, dão a volta e vão embora. Se eu não fosse da Guarda também teria essa atitude porque não há mais nada atrativo e que nos cative a fazer uma visita turística na cidade. Dou um exemplo que acho significativo de como está a política de turismo: a Guarda não tem um guia turístico. Já fomos contactados por empresas espanholas para fazermos visitas turísticas porque ligam para o posto de turismo e não há ninguém, a Torre de Menagem está fechada todo o ano, a Torre dos Ferreiros esteve fechada durante muito tempo e para subir pelo elevador tinha de se ir buscar a chave ao turismo. É inacreditável. O Hotel Turismo é o que todos sabemos, não há uma solução para aquele edifício. O poder central também tem culpa, mas não há uma pressão por parte da Câmara Municipal, ou a que há é pouca. Vivo há muitos anos na Guarda, já ouvi muitas promessas de todos os partidos e continuo a ver que não foram realizadas nem executadas.

P – Como operador turístico, vai baixar os braços?
R – Não. Todo o negócio na Guarda é difícil. As empresas têm muita dificuldade em sobreviver, mas não vou baixar os braços. Se hoje dermos uma volta pela cidade e outra daqui a um mês, vamos encontrar lojas fechadas. Veja-se como está o comércio na Guarda: morto, parado. O poder camarário devia ver isto e não vê.

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LUÍS FILIPE GASPAR

Empresário do setor do turismo

Idade: 62 anos

Naturalidade: Guarda

Profissão: Empresário

Currículo (resumido): Empresário do setor do turismo; Diretor de empresas no setor automóvel; Administrador do CECOA – Centro de Formação do Comércio e Afins (Lisboa); Elemento da comissão de acompanhamento do programa europeu “Assist” (Lisboa); Presidente da Associação Comercial da Guarda; Diretor da Federação do Comércio Retalhista; Diretor da Confederação do Comércio Português

Livro preferido: “O Principezinho”, de Antoine de Saint-Exupéry

Filme preferido: “Forrest Gump”, de Robert Zemeckis

Hobbies: Leitura

Sobre o autor

Sofia Pereira

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