Sociedade

Mulheres que começam a dominar um mundo que era dos homens

Escrito por Carina Fernandes

Apesar de ainda existirem desigualdades sociais entre homens e mulher, a distinção entre géneros está cada vez mais ténue. O sexo feminino começa a ocupar espaços e a desempenhar atividades que, em tempos, eram exclusivas do sexo oposto.

Com a celebração internacional do Dia da Mulher (8 de março) é comum virem a público as problemáticas e injustiças sociais que o mundo feminino tem sofrido e sofre ao longo dos anos. Uma das maiores problemáticas contra as quais as mulheres têm lutado é a desigualdade, seja ela no mundo laboral, no tratamento por parte da sociedade ou na diferença de direitos e deveres. Apesar de ainda ser preciso fazer mais, muito já foi alterado nos últimos anos graças à luta e perseverança de algumas mulheres. O INTERIOR falou com algumas delas cuja profissão é, por norma, associada à figura masculina.

Nunca senti que pusessem em causa o meu profissionalismo por ser mulher

Bernardete Nunes é motorista de passageiros desde 2011. «A carta de pesados surgiu em conversa com um amigo que também faz esse tipo de transportes», adianta. Depois começou por alguns serviços na empresa Viúva e Carneiro, da Mêda, até que chegou à Câmara Municipal de Trancoso, onde trabalha atualmente ao mesmo tempo que faz alguns serviços na Escola Profissional local. Mas nem sempre o transporte de passageiros foi a sua atividade principal. A motorista de 44 anos era cabeleireira, mas a saúde falou mais alto e teve de abdicar dessa atividade: «Tinha uma alergia aos produtos que eram usados no salão», refere Bernardete Nunes, o que a fez abdicar de uma profissão que em tempos desejou.

No entanto, ao contrário do que se possa pensar, a ex-cabeleireira é muito feliz na sua profissão atual. «Adoro aquilo que faço», declara de forma determinada. O facto de sempre ter gostado de conduzir também ajuda: «Eu já gostava de conduzir e a diferença de um ligeiro para um pesado não é quase nenhuma. É só fazer uma perpendicular mais larga numa curva», ironiza a originária da Mêda. «O meu marido também é motorista de mercadorias, o que ajudou a que a família sempre me apoiasse. Nunca senti aquela coisa de que podia ser uma profissão perigosa por ser mulher, nunca senti esse tipo de preconceito», acrescenta. Porém, ainda há pessoas que estranham quando veem uma mulher ao volante de um autocarro. «Às vezes, quando estou a trabalhar as pessoas ainda ficam a olhar para mim, principalmente no meio das aldeias», refere Bernardete Nunes.

Já no meio laboral a motorista afirma nunca ter sentido nenhum tipo de preconceito por parte dos colegas ou da entidade patronal: «Nunca senti que pusessem em causa o meu profissionalismo por ser mulher», afirma a medense, acrescentando que, em relação aos salários, não sabe se os colegas «ganham mais cem ou menos cem» do que ela, mas acredita que não existe uma diferenciação pelo género.

Desde que me conheço que a bola era o meu presente predileto

Beatriz Fonseca é uma jovem de 22 anos, natural da Guarda, e apaixonada pelo futebol atualmente ao serviço do Estoril-Praia. «Desde que me conheço que a bola era o meu presente predileto», confessa a jogadora.

A atleta garante «nunca» ter sentido qualquer tipo de discriminação ao longo do seu percurso pelo mundo futebolístico, ao contrário do que se possa pensar. «Pelo contrário, até sinto por vezes alguma curiosidade do outro lado», confessa. É graças a essa mesma curiosidade que existe por parte das pessoas que o estigma em relação ao futebol feminino tem vindo a alterar-se, considera Beatriz Fonseca, para quem «a mulher vai ganhando cada vez mais o seu espaço neste desporto. Neste momento a realidade do futebol feminino aproxima-se do mundo do futebol masculino, procurando-se cada vez mais a igualdade de género», acredita a jogadora. Essa valorização que o futebol feminino tem vindo a ganhar nos últimos anos deve-se também à visibilidade que «a entrada de alguns clubes profissionais e de renome» trouxeram à modalidade, o que contribuiu para a sua expansão e deu «maior visibilidade à atleta feminina», acredita a guardense.

Contudo, a jovem acredita que ainda há um longo caminho a percorrer para a total valorização do futebol feminino. «Será sempre um processo progressivo e acredito que a pouco e pouco iremos lá chegar», declara a também estudante da licenciatura de Gestão de Recursos Humanos.

Tenho clientes que vêm cá por mim porque gosto de falar com as pessoas

Normalmente, o que seja relacionado com carros é imediatamente associado ao género masculino. Como é o caso dos postos de abastecimento de combustível, mas há algum tempo que as mulheres têm vindo a ocupar também espaço nessa atividade.

É o caso de Arminda Nascimento, que é funcionária de uma bomba há quase 20 anos no “coração” da cidade de Pinhel. Quando começou ainda não era muito habitual ver-se uma mulher a fazer esse tipo de serviço, aliás, «as pessoas até achavam graça. Até porque naquela altura também eram poucas as bombas que tinham um funcionário a fazer o abastecimento e então achavam graça a ser uma mulher», recorda. Arminda Nascimento confessa que não é um serviço fácil, principalmente por causa dos horários que tem de cumprir: «Faço 11 horas praticamente todos os dias», afirma, o que acaba por afetar um pouco a vida pessoal da funcionária de 54 anos. «Não consigo ir a uma cabeleireira, não posso fazer compras porque às horas que entro ainda não está nada aberto e quando saio já fechou tudo», exemplifica.

Mas, apesar dessa privação, Arminda Nascimento não trocava «por nada» aquilo que faz nem o sítio onde trabalha. «Os patrões sempre foram impecáveis comigo. E se agora me mandassem para outra bomba eu já não ia gostar tanto, tinha que ir claro, mas não era a mesma coisa», confessa. A funcionária nunca se apercebeu de qualquer tipo de preconceito por ser mulher, porque acredita que o que prende o cliente é a sua personalidade. «Eu gosto muito de falar com as pessoas, vou dizendo uma piada ou duas e as pessoas gostam e acabam por voltar. Eu tenho clientes que cá vêm por mim», enaltece a funcionária da bomba de gasolina.

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Carina Fernandes

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