Era uma vez um sinal de trânsito. Era um sinal informativo. Ao contrário dos seus colegas de estrada, não obrigava nem proibia. Informava. Não tinha vocação totalitária. A sua indicação, embora preciosa, podia ser seguida ou não. Ninguém era multado por não seguir o seu conselho.
Por não ser de obrigações ou de proibições, era um sinal tolerante. Informava, mas cabia a cada um decidir o rumo e a velocidade. Não impunha limites. Sugeria, opinava, mas aceitava que a escolha final era dos indivíduos que por ele passavam.
Durante muitas décadas, o sinal informativo, com indicações preciosas, mas que não obrigava nem proibia, foi respeitado. Não necessariamente seguido, porque cada um tinha a liberdade de fazer o que lhe desse na gana, mas respeitado, porque a sua informação, preciosa, era tida em consideração.
Depois, foram chegando as turbas que queriam proibir coisas, e atrás delas as outras turbas que queriam obrigar a outras coisas. As turbas, turbulentas por definição e obviamente ululantes, por Nélson Rodrigues, não querem saber de informações ou indicações. Só de obrigações ou proibições.
Essas multidões foram espalhando pela estrada sinais de obrigação e sinais de proibição. O sinal de informação, embora oferecendo indicação preciosa, tornou-se cada vez menos visível, escondido e perdido no meio de tantas regras de obrigação e de proibição.
Certo dia, uma turba ainda mais ululante do que as outras, prestou atenção ao sinal informativo. Viu a sua indicação preciosa, que não proibia, que não obrigava. Por não proibir, por não obrigar, por simplesmente informar, a turba ainda mais ululante logo ali decidiu que apenas dar indicações, sem estabelecer uma regra ou um limite, era muito confuso. Um sinal não podia permitir o acesso ao livre-arbítrio. Ou bem que proíbe, ou bem que obriga.
E a turba, ainda mais ululante do que os ululantes óbvios que Nélson Rodrigues alguma vez conheceu, arrancou o sinal, o sinal informativo que dava preciosas indicações, partiu-o ao meio e deixou-o na berma, de face voltada para o chão. Finalmente, a utopia da admirável estrada nova, onde só há lugar para sinais de obrigações e proibições, tinha sido perfeitamente alcançada.
* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia