Recentemente, ao visitar um familiar em Lisboa, apercebi-me da existência de um tipo de povoamento a que chamei de povoamento compacto “abusivo”, ou seja, áreas residenciais que se caracterizam pela construção em altura, prédios enormes e com a ausência de qualquer atividade económica nesses locais, até mesmo de uma simples pastelaria.
Apercebi-me também de outras duas características deste local, nomeadamente o facto de as habitações estarem ladeadas pela passagem de uma autoestrada e ser população de baixos rendimentos que habita neste local. No entanto, embora tenha pernoitado apenas por duas noites neste local, questionei a minha qualidade de vida ao tentar entender como é possível dormir com o constante barulho das viaturas a passar na referida autoestrada. Deste modo entendi a razão pela qual alguns inquilinos dormem com tampões nos ouvidos.
Curiosamente, surge recentemente uma nova moda no turismo, o turismo do sono, em que o serviço prestado pelos hotéis tem o foco principal em proporcionar um bom sono ao cliente. Segundo o relatório da Agência Ambiental Europeia “Noise in Europe – 2020”, «o tráfego rodoviário constitui a principal fonte de poluição sonora na Europa». As estatísticas presentes no relatório indicam que existem aproximadamente 22 milhões de pessoas afetadas e a ocorrência de 12 mil mortes prematuras devido a este problema.
Em Portugal as pesquisas da Agência Portuguesa do Ambiente revelam a relação direta entre as perturbações no sono devido à poluição sonora – «Os cálculos, feitos com base nos mapas estratégicos do ruído de seis dos mais populosos municípios portugueses — Lisboa, Porto, Oeiras, Odivelas, Amadora e Matosinhos — indicam que perto de dois milhões de pessoas são potencialmente vítimas de poluição sonora».
Comparando os mapas municipais de ruído das principais áreas urbanas como, por exemplo, concelhos do interior do país como Alfândega da Fé, Vila Flor ou Mogadouro, as diferenças são significativas, tendo este indicador valores muito inferiores nas áreas rurais, possibilitando deste modo alguma qualidade de vida, tendo em conta esta problemática. Sabendo que 25% da população nacional vive com menos de 600 euros por mês e sabendo que a maioria da população vive em áreas urbanas, alguma dela em áreas residenciais com forte ruído noturno, não será injusto a população que mais precisa de fazer turismo do sono seja a que tem menos condições económicas para o fazer?
*Bruno Carmo, Doutorando em Território, Risco e Políticas Públicas