Em nome da informação, o Estatuto do Ministério Público prevê que seja «assegurado o acesso, pelo público e pelos órgãos de comunicação social, à informação relativa à atividade do Ministério Público, nos termos da lei». Obviamente que, talvez por ser tão extensa ou, simplesmente, condicionada pelos termos da lei, apenas alguma dessa atividade sobressairá nos empolados discursos dos repetidos comentadores televisivos da atualidade: as suspeitas e as investigações do Ministério Público relativas aos políticos. De tão repisada, esta informação acabará por nos ficar nos ouvidos, a martelar-nos a cabeça, a confundir-nos as ideias, mas, aparentemente, no fluxo comunicativo, será o que menos importa aos que a têm propalado. Todavia, aquilo que nesta disfuncionalidade democrática nos deveria levar a questões sobre a intencionalidade de tanto caso e descaso parece não nos deixar ir além da conclusão de que os políticos são todos uns corruptos, malfeitores de primeira apanha, que só existem para esbanjar memória de recursos investigativos electrónicos com as suspeitas sobre a sua conduta. Além de nos trapacearem e roubarem, evidentemente.
Depois das suspeitas de ilegalidades cometidas pelos visados, divulgadas à exaustão, costuma adiantar de pouco, para a restauração da idoneidade dos visados, o desfecho das investigações do Ministério Público. Que o digam, entre outros, Paulo Pedroso, Mário Lino, António Mendonça, Azeredo Lopes, do Partido Socialista, ou Miguel Macedo do Partido Social Democrata, que foram absolvidos em tribunal, ou, por exemplo, também Eduardo Cabrita, Luísa Salgueiro, Manuel Pizarro, Pedro Siza Vieira, Graça Fonseca, Fernando Medina, Duarte Cordeiro e Costa Pina, cujos processos foram, pura e simplesmente, arquivados. Porque, dependendo do público, há sempre quem considere que a justiça é branda para com os “ricos e poderosos”. Ou seja, a suspeição prevalecerá sobre qualquer conclusão jurídica que não corrobore as anteriores narrativas acusatórias. O que era para ser demonstrado, para muitos, excessivos, ficou demonstrado, sem mais necessidade de argumentação, do que aquela que os comentadores, sempre os mesmos, durante todo o tempo e em todos os meios de comunicação, expuseram. Ora, se o foco do Ministério Público, sempre tão suspeitoso e investigativo da ação dos políticos, pouco ou nada sai do âmbito a que nos habituou, isto bem poderá significar que os fenómenos corruptivos, prevaricadores e de tráfico de influências, em Portugal, estão circunscritos à atividade política. O que parecendo pouco acaba por não o ser assim tanto, pois ficamos sempre muito “mais descansados” por saber que não há comentadores, jornalistas, juízes, professores, médicos, engenheiros, taxistas, assistentes operacionais, operários, influenciadores, produtores de conteúdos digitais e o mais que nos aprouver, corruptos, prevaricadores e traficantes de influências. Ou seja, para acabar com estas três configurações da ilegalidade e ilicitude, bastará acabar com os políticos, começando por os queimar nas fogueiras que certas ideologias, extremistas e radicais, deram em acender por todo o lado. Se disso estão conscientes quem as ajuda é que ainda não sabemos. Mas, a ser assim, o caso será muito mais grave do que aquilo que o fazíamos, pois significará que os estragos provocados na democracia já atingiram as suas bases.
Quod erat dmonstradum!
“(…) aquilo que nesta disfuncionalidade democrática nos deveria levar a questões sobre a intencionalidade de tanto caso e descaso parece não nos deixar ir além da conclusão de que os políticos são todos uns corruptos, malfeitores de primeira apanha, que só existem para esbanjar memória de recursos investigativos electrónicos com as suspeitas sobre a sua conduta.”