A Universidade de Exeter, no Reino Unido, vai passar a oferecer um curso sobre Magia. Suponho que terá vagas especiais para os alunos saídos de Hogwarts, e não me admiraria que entre os seus professores estivessem Panoramix, o druida gaulês, Gandalf, o feiticeiro cinzento, e Kanaloa, o rebelde polinésio.
Entre poções, unguentos e feitiços, haverá seminários variados sobre membros das diversas famílias mitológicas do mundo inteiro. Osíris, do Egipto, talvez não aceite viajar até Inglaterra enquanto o Museu Britânico não devolver as suas múmias. Perkūnas, o deus báltico dos trovões, por ser incerto e casmurro, ainda não confirmou a presença. A asteca Coatlicue e a grega Atena estarão na primeira linha dos protestos feministas contra o patriarcalismo estrutural dos panteões internacionais. Com certeza, os duendes irlandeses assinalarão o seu descontentamento com o colonialismo inglês, tanto através de pequenas malfeitorias como de engraçados limericks.
Na senda de recuperar o que consideram ser um estado natural obnubilado pelo positivismo e pela modernidade, a voragem pós-colonial da esquerda foucaultiana e a tradição neo-romântica da direita etnocêntrica encontram-se finalmente na mesma sala – um curso de magia. A verdade é que estudar magia soa tão apelativo para o wokismo anti-capitalista como para o neopaganismo etno-fascista.
O cristianismo, o racionalismo e a ciência moderna trouxeram algum descrédito às danças das fadas e aos espíritos das árvores, o que provoca a mesma reacção no woke-relativismo e no etno-romantismo: reclamar a descolonização das mitologias pré-cristãs da perfídia expansionista do Império Romano e seus sucessores milenares.
Embora acreditem em coisas parecidas, ou até precisamente pela semelhança das crenças, estas duas tribos odeiam-se mutuamente. Caso se encontrem na mesma sala de aula do curso de magia, o mais provável é que acabem à batatada entre acusações de radicalismo e xenofobia. Ou, para terminar em beleza circular, se ataquem uns aos outros com abracadabras e ervas daninhas.
* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia