Pecados rurais

Escrito por Albino Bárbara

“Isso pouco importa porque a troca da pasmaceira do tal cantinho era sempre positiva e a novidade traria consigo as célebres e autênticas moules bruxelenses e uma ida constante a coisas e sítios diferentes (…)”

Na pequena localidade do Curral e dos Moinas a vida é uma parvalheira e nem as primas recentemente chegadas da capital conseguem fazer a diferença, pois alguns dos bem-aventurados deixaram de prevaricar no pequeno pecado venal passando para a ruralidade dos maiores pecados mortais, mesmo percebendo que Deus lhes ofereceu uma segunda oportunidade de alcançarem uma vida de sacristia e, quiçá, lá mais para a frente, o gozo dos esplendores da luz perpétua.
Marcelito, grande alcaide da União de Freguesias do Curral e dos Moinas, percebe que o comportamento do presidente do clube do tirinho às pombas, recentemente investido na função, passou a envergar um elegante fato caqui espinhense, o que faz dele um líder grunge, e compara-o com o seu congénere do Curral dos Belzebus onde a ruralidade tem requinte e o charme do urbano/rustico aporta consigo uma corja de rockeiros, metaleiros, punks, manuelinos, romanos, todos eles bem próximos a um estilo coach.
Marcelito, desculpem tratar o senhor alcaide desta forma, é que ele mete o bico em tudo, mas, é um tipo porreiro, até tira umas selfies com todos os fregueses, ao saber que os primos da quinta da Vergalhuda eram herdeiros da fortuna do tio Espírito Santo, que entretanto lhes deixou a casita da Boca do Inferno mais o celebre e bem recheado, a custa de todos nós, BICO (Banco Internacional de Crédito Oficial), aconselhou-os a irem para a capital e gozar o glamour de todos os prazeres citadinos.
Seguiram o conselho e lá foram eles. Um passou a viver na Quinta da Marinha. O outro na casita de Cascais e, como a massita era muita, o forró passou a ser uma constante. O jarrinho de barro com tinto martelado do Curral passou a dar lugar à garrafa de rolha e, das mais caras. Da tasca do Zé Chiqueiro dos Moinas frequenta-se agora o Alma, O Belcanto, O Fifty Seconds e até o 100 Maneiras e dos dois cavalitos com motor quase a pifar andam diariamente de Jag e de Ferrari.
A história não acaba aqui.
Os priminhos da quinta da Vergalhuda quiseram ir um pouco mais longe e, curiosamente ou talvez não, meteram-se na política e chegaram rapidamente a deputados da nação. Um eleito por um partido, outro por outro… não fosse o diabo tecê-las, até porque o princípio seguido no Curral dos Moinas tem a ver com aquela porquinha parideira em que todos os recos mamam alternadamente.
Pois bem, no Parlamento os priminhos foram exímios nas suas eloquentes intervenções defendendo com unhas e dentes a União de Freguesias do Curral e dos Moinas. Intervenções essas só comparadas às da Catarina, da Ana e do “chico” Nuno.
Mas…há sempre um mas…os priminhos fartaram-se de estar na capital e acharam que deviam mudar de ares e partir para outras paragens. Com esse intuito, convidaram para um jantarzito uma série de compinchas onde, entre outros, lá estavam o Pedrocas urbano, o Luís rural, este último que, entretanto, tinha trocado o Moreira pelo jovem comentador e corredor do sistema Sébastien Loeb, afirmando de viva voz que isto já não ia lá com passos de coelho.
Entre umas Barcas Velhas e uns Peras Mancas do Isaltino, foi um instante, num tu cá, tu lá. Falavam à esquerda e à direita com os camaradas Paupério, com o Tânger do Qatar, com a Dona Isilda (que até é de cá) e na conversa não escapou a troca/baldroca do Chico pela Martinha (ou não fosse ela a candidata à maior autarquia do reino da Dinamarca). Já nos digestivos, um Macallan de 74 acompanhou o tal cafezinho de Campo Maior, e todos, sem exceção, fizeram questão que o Julinho ficasse, nem que fosse à navalhada, num lugarzito qualquer.
A conversa continuou pela noite dentro e os priminhos da Quinta da Vergalhuda do Curral dos Moinas envolveram-se numa discussão sem pés nem cabeça. Afinal, coitados, só iriam receber uns trocados, um vencimento que pouco passa dos 8.000/mês + 320/dia + 160/reunião + pagamento de transportes em executiva ou 0,53/km em carro próprio + despesas gerais de 4.500/mês + todas as restantes alcavalas (que não são poucas), concordando todos eles que no final do mandato a conta do BICO ficaria com um pouco mais de um milhão de euros.
Isso pouco importa porque a troca da pasmaceira do tal cantinho era sempre positiva e a novidade traria consigo as célebres e autênticas moules bruxelenses e uma ida constante a coisas e sítios diferentes: ao Pois Chiche, Au Cor de Chasse ou mesmo ao Falstaff.
A vida é assim, uns com muito outros com pouco. Que o diga o Benigni se a vida não é bela.
Agora sim… a historieta da União de Freguesias do Curral e dos Moinas fica por aqui. Acrescento apenas uma nota final: Qualquer semelhança com pessoas ou situações aqui referidas terá sido uma mera coincidência.

Sobre o autor

Albino Bárbara

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