Nas últimas semanas fomos surpreendidos pela inenarrável prestação dos “grandes devedores do Novo Banco” nas suas idas à Assembleia da República. Empresários conhecidos, e até há pouco tempo altamente reconhecidos na alta roda financeira do país, foram chamados à Comissão de Inquérito e exibiram uma mistura de esperteza saloia com esquecimento, burrice e soberba. Mau de mais para ser verdade! Mas foi verdade.
Nomes conhecidos, respeitados, gente que se passeia com a aura de sucesso e privilégios e prorrogativas imensas, que afinal não passam de espertalhões que “não têm onde cair mortos”… Uma certa “elite” impune e intrujona a quem tudo é desculpado, que vivem muito acima das suas possibilidades ou que vivem de acordo com as possibilidades conhecidas. Empresários falidos, mas com “pedigree”; gestores de eleição a quem a banca empresta milhões; quadros de sucesso com o dinheiro dos outros…
Gente de uma casta respeitada, que se passeia pelo país com glamour e topete, que se riem de todos – as famosas gargalhadas de Berardo não podem ser esquecidas – como se todos fossem seus servidores… Os famosos grandes devedores do Novo Banco eram grandes clientes do BES, era gente com relações mais ou menos privilegiadas, com amigos no poder, no futebol como na política, a quem nunca foram feitas execuções de património e sobre quem sobram perdas para serem pagas pelo Estado.
«Se deves mil, o problema é teu, se deves milhões, o problema é do banco», ou dos contribuintes que acabam por ter de suportar e pagar os buracos que vão sendo deixados na banca por estafas sem controlo, sem rosto e sem dinheiro para pagar os créditos.
Mas se os “grandes devedores” do Novo Banco vão sendo identificados e “apontados a dedo” (ainda que não enxovalhados, como mereciam, e continuem sem pagar, como tinham a obrigação), há muitos devedores desconhecidos e que continuam imunes à queda de um sistema clientelar de amiguismo e interesses.
E há um outro universo que inclui os devedores ao fisco e à segurança social. Milhões de impostos por cobrar em empresas falidas ou sem futuro, com o património em nome dos filhos, dos primos ou dos enteados. E há bens penhorados por dívidas fiscais ou à segurança social, mas que estranhamente não são vendidos por arrastamento de processos litigiosos ou por lentidão processual. Quem não conhece situações assim? Situações com que todos acabamos por ser complacentes e “compreensivos”, milhões que vão sendo perdoados ou vão ficando por cobrar a “grandes devedores” fiscais que conhecemos, mas a quem não apontamos o dedo (aos “pequenos”, o Estado cobra coercivamente com celeridade e sem pestanejar). Se agora todos nos rimos com a ignóbil eloquência do esquecimento dos grandes devedores ao Novo Banco, é tempo de começarmos a apontar o dedo, a enxovalhar e a exigir que os grandes devedores ao fisco e à segurança social paguem o que devem sem subterfúgios, sem adiamentos, sem prescrições e sem se rirem do cidadão comum.
Os pequenos pagam e os grandes ficam-se a rir
«é tempo de começarmos a apontar o dedo, a enxovalhar e a exigir que os grandes devedores ao fisco e à segurança social paguem o que devem sem subterfúgios, sem adiamentos, sem prescrições e sem se rirem do cidadão comum»