O impacto da crise pandémica na economia, nomeadamente com as medidas de confinamento e as restrições ao exercício de muitas atividades económicas, é obviamente muito elevado. Os números macroeconómicos conhecidos confirmam-no, mas dão-nos apenas uma imagem relativamente superficial da situação.
Desde logo, porque os efeitos da crise são profundamente assimétricos, atingindo mais uns sectores do que outros. Por outro lado, as políticas públicas de apoio, mesmo com atrasos e insuficiências, suspenderam inevitáveis despedimentos e encerramentos em massa. Setores, total ou parcialmente, paralisados só não viram a maioria das empresas colapsar e só não deram ainda origem a uma crise social de grandes proporções porque temos despesa pública a suportar salários (até quando?), porque muitos pagamentos foram adiados com moratórias ou por simples incumprimento e porque muitas centenas de milhares de pequenos e médios empresários, dos referidos sectores mais atingidos, teimam em não desistir e procuram resistir até ao limite do suportável.
Mas conter a crise não significa que os problemas estejam controlados, pois em muitos casos eles foram simplesmente adiados. As quebras no presente, de atividade e de faturação, vão ter seguramente um impacto diferido no tempo sobre a sustentabilidade de muitas empresas, sendo provável que, quando o país puder anunciar o fim da crise, com o PIB de novo a crescer, possa soar a hora da verdade para uma parte do nosso tecido empresarial a viver com margens comerciais baixas e sem margem para suportar grandes oscilações no mercado.
Pelo que, ou as políticas públicas vão ser capazes de intervir nesse preciso momento com as medidas necessárias ou iremos ter muitos mais encerramentos e o desemprego irá disparar.
Acresce a tudo isto que o efeito assimétrico não se faz sentir apenas no período da crise pandémica e como resultado direto das restrições impostas ao exercício de algumas atividades, no pós-crise as assimetrias geradas pela crise vão, de um modo geral, persistir. Sectores como o turismo, uma grande parte das atividades de comércio, restauração e serviços, sobretudo no interior do país, não vão simplesmente poder regressar de novo a 2019.
Em alguns casos, esse regresso não vai mesmo ter lugar no futuro. Os novos hábitos de vida e de consumo, ligados com padrões de mobilidade que, no pós-crise, não serão propriamente os mesmos de antes da crise, provocarão quebras acentuadas e persistentes na procura e darão lugar a uma reorientação do consumo, obrigando as empresas a reajustarem-se, a reinventarem-se.
É, pois, tempo de mudar de atitude na definição e implementação das políticas públicas, é necessário abandonar a forma tradicional de fazer política, em que temos políticas transversais, que se aplicam a todo o território, sem se ter em conta as especificidades dos territórios, sobretudo dos mais frágeis. Não podemos aceitar o que aconteceu, por exemplo, recentemente com o Programa de Apoio á Produção Nacional, que exclui a grande maioria das empresas da nossa região. Acredito nas nossas gentes, nos nossos empresários e na sua capacidade de superação, mas se os nossos governantes não nos querem ajudar, pelo menos não nos dificultem mais a vida.
Impõe-se um novo posicionamento dos atores do território, mais solidário, mais exigente e mais pragmático interpretando os desafios que a pandemia nos colocou como uma oportunidade. Para o efeito, a cooperação passou a ser a chave decisiva das soluções a implementar, contando com todos de igual forma.
Tomás Martins
Presidente da AENEBEIRA – Associação Empresarial do Nordeste da Beira