Numa tradução simples, renaturalizar. A palavra só não adianta muito, convém, portanto, esclarecer o que se pretende dizer com esta nova expressão do mundo da conservação da natureza. Vejamos o que é a renaturalização e como pode contribuir para um futuro mais sustentável em Portugal.
O rewilding é uma forma prática, progressista e inovadora de conservação da natureza e da biodiversidade, em que o nosso papel é promover que a natureza atinja o seu potencial máximo, com todas as espécies nativas da região presentes e desempenhando as suas funções – quer sejam processos naturais, quer outros importantes serviços ecossistémicos
Assim dito pode parecer complicado, mas é bastante simples. Na grande árvore das ciências, um dos ramos é o da biologia e, nele, existe um ramo mais pequeno, a ecologia e, na sua ponta, está o ramo do restauro ecológico que tem pelo menos numa das suas folhas uma abordagem nova que procura, além de estancar a perda de biodiversidade, conseguir reverter a tendência e de facto aumentá-la. Chamemos a essa folhinha “renaturalização”.
Um dos princípios da renaturalização diz-nos que devemos intervir na natureza numa fase inicial para que não o tenhamos de continuar a fazer no futuro. Ou seja, se uma paisagem está degradada, e faltam espécies-chave ou estão presentes espécies invasoras, poderá ser preciso intervir para remover essas espécies invasoras e promover o retorno da vida selvagem nativa. Tendo isso feito, devemos deixar que as coisas sigam o seu rumo natural, com o mínimo de intervenção humana.
Esta nova abordagem não se reveste de poderes mágicos, mas reconhece humildemente que a natureza sabe tratar de si mesma. E será capaz de o fazer ainda melhor se lhe forem dadas as ferramentas necessárias e espaço/tempo para que atinja o seu potencial. Que intervenções e ferramentas podemos então usar para renaturalizar áreas naturais? As que me refiro são simples na grande maioria, e algumas são facilmente acessíveis e de baixo custo, sendo aplicáveis em grande escala.
Uma destas é a introdução de grandes herbívoros na paisagem. Em muitas regiões portuguesas, existiram outrora espécies de grandes herbívoros que mantinham zonas de pastagens abertas, impedindo que estas acumulassem arbustos ao longo do tempo, tornando-se eventualmente em florestas. Hoje em dia, grandes herbívoros como por exemplo cavalos podem desempenhar um papel fundamental na prevenção de incêndios rurais, consumindo material combustível em grandes áreas. Estes desempenham assim funções críticas tanto para os ecossistemas naturais como para as comunidades locais e são uma ferramenta-chave do processo.
O comportamento destes herbívoros é, por sua vez, influenciado pelos carnívoros, que ao perseguirem-nos para caçar influenciam onde e como os animais se movimentam, evitando que áreas sejam sobrepastoreadas, o que afeta também a composição e distribuição das plantas, aumentando a biodiversidade nas pastagens. A predação cria por sua vez oportunidades para as aves necrófagas (que se alimentam de cadáveres de animais mortos) e que redistribuem nutrientes pelo solo que mais uma vez influencia a maneira como as plantas crescem. E tudo isto está sempre em movimento, uma natureza completa, funcional e constantemente em evolução.
A vida não será, definitivamente, como era antes pois nunca se falou aqui em reverter nada, mas apenas em dar oportunidade para que a vida seja amanhã melhor do que é hoje.
Aqui, pode o nosso mais recente documentário, que explica melhor o trabalho que vem sendo desenvolvido no terreno pela nossa organização, em prole de um Portugal mais selvagem: https://www.youtube.com/watch?v=zMIKoBumr9s
* Líder de equipa da Rewilding Portugal