O preço da água

“Poupar água tem de ser uma obrigação individual e coletiva. Porventura a mais importante deste século”

Um simples copo de água não custa o mesmo em todo o país. A conclusão é da Deco Proteste num estudo com base nos tarifários de abastecimento de água, saneamento e tratamento de resíduos em vigor em junho de 2023, em 308 concelhos do país, que permite, desde logo, perceber que há preços díspares para um serviço similar. Aliás, as discrepâncias de preços monumentais são difíceis de explicar, e ainda mais se tivermos a perceção de que o sistema de distribuição prima pelo desperdício. Aumentar de forma desproporcional o preço da água é o habitual nos concelhos mais “preguiçosos” e que, perante “fugas” e ineficiência na gestão da rede em vez de renovar tubos, substituir condutas velhas ou fechar a torneira no verão na rega de jardins, rotundas e alcatrão, aumentam o preço…
Se o Fundão é o concelho com água mais cara do país, pulverizando todos os números do estudo, a Covilhã fecha o pódio sendo o terceiro concelho com água mais cara em Portugal. De resto, também o concelho da Guarda está entre os que têm um tarifário mais alto a nível nacional. Assim, surpreendentemente, vemos que Fundão, Covilhã e Guarda estão entre os concelhos que cobram mais de 321 euros por 120 metros cúbicos, quase o dobro do preço da tarifa em Lisboa – cuja água vai da Serra da Estrela (Barragem de Castelo de Bode, no Rio Zêzere).
A fatura da água inclui um puzzle de três custos: água, saneamento e resíduos sólidos. Ou seja, na capital são muitos mais, fazem imensamente mais lixo e detritos, consomem a água que vai da serra, mas pagam menos que no Fundão, na Covilhã ou na Guarda. Porém, segundo o estudo, o Fundão cobra a água mais cara do país, mas é também um dos concelhos que mais tem investido em eficiência e renovação da rede em baixa, tendo reduzido o desperdício.
Por isso, enquanto o Algarve anuncia a maior seca dos últimos anos e teme-se que, se não chover (no Sul), a água em breve poderá ter de ser racionada – por estes dias chove por todo o norte e centro do país, mas a água é um bem essencial, escasso, que não controlamos e cujo armazenamento e gestão eficiente são determinantes para o presente e futuro.
Devemos defender a recuperação de projetos como o da Barragem de Girabolhos (considerada essencial para a reserva de água e gestão do Rio Mondego, mas de que o Governo de António Costa lamentavelmente desistiu) ou o lançamento da construção da Barragem da Cabeça Alta, que o presidente da Câmara da Guarda tem defendido como crucial para a região – esta barragem, no concelho de Celorico da Beira, permitiria o abastecimento de água a esse concelho e seria determinante para a melhor gestão da reserva de água na Barragem do Caldeirão, a montante, que abastece a cidade da Guarda, por forma a evitar a necessidade de descargas no Rio Mondego para encher os açudes que abastecem a jusante as populações e que em anos de seca deixa a Barragem do Caldeirão em situação crítica. Ao mesmo tempo que não compreendemos porque é que a água é muito mais cara no Fundão, na Covilhã ou na Guarda do que em Castelo Branco, em Viseu ou em Coimbra – e a orografia não justifica tudo.
Quando ouvimos falar de aumentos, como o anunciado na Guarda, temos de ficar preocupados e perguntar se é para investir no sistema, na sua renovação e eficiência, ou é para facilmente aumentar as receitas municipais que depois são depauperadas na coisa pública. Por outro lado, o aumento do preço também é um argumento para combater o desperdício e promover a poupança – há duas opções obrigatórias e que se recomendam a todas as autarquias: lançar campanhas (sistemáticas) de sensibilização e poupança de água e eficiência na captação, distribuição e qualificação da rede. Poupar água tem de ser uma obrigação individual e coletiva. Porventura a mais importante deste século. E é enquanto chove que devemos discutir e precaver a falta de água.

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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