Os media têm cada vez menos fronteiras – nos conteúdos que difundem, nas audiências e nos consumidores, nas zonas de difusão, na propriedade e nos investimentos. Os sítios na Internet acolhem cada vez mais conteúdos produzidos pelos utilizadores.
Os órgãos de comunicação social continuam assim a perder o monopólio da informação que circula na sociedade. Para definir o que é um órgão de comunicação tornou-se fundamental apurar se existe a intenção de atuar como media, contrapartida económica, continuidade, controlo editorial, respeito pelas regras da profissão de jornalista. Pouco importa já o suporte desse órgão de comunicação, a forma de difusão ou o formato.
Há vantagens nesta nova realidade: acesso instantâneo a múltiplas fontes de informação à escala mundial, mais gente a participar no processo informativo, mais formas de aceder à informação.
Existem, todavia, evidentes perigos e desvantagens, como o enfraquecimento e a perda de influência dos media tradicionais, sujeitos a escrutínio jurídico, regulatório e deontológico. Os “prosumers”, ou cidadãos produtores de informação, os falsos órgãos online e as redes sociais escapam mais facilmente a essa vigilância. Muitos órgãos online escapam desse escrutínio porque não estão registados em Portugal, embora visem o público e os anunciantes portugueses. Desta forma, não há transparência da propriedade, sujeição à regulação e à lei portuguesa, controlo editorial, respeito pelas regras deontológicas. Esses órgãos constituem um terreno propício à desinformação e à mentira.
Face a esta evolução, há desafios para o poder político. Em primeiro lugar, impedir que órgãos não registados continuem a invadir impunemente o espaço mediático. Em segundo lugar, tal como na generalidade das democracias europeias, considerar que a comunicação social desempenha um serviço de interesse público essencial para a vitalidade do regime democrático, pelo que o Estado não pode alhear-se das condições concretas em que ela desempenha as suas funções, nomeadamente através de um sistema de incentivos que aposte, por exemplo, no equipamento tecnológico e na empregabilidade de jornalistas.
É verdade que compete sobretudo às empresas assegurarem os recursos essenciais para a sua atividade. No entanto, o Estado deve preocupar-se com a rentabilidade de empresas cuja atividade é decisiva para assegurar a liberdade e o pluralismo da comunicação social.
Portugal tem especificidades que impõem uma redobrada atenção do poder político: há escassas sinergias com operadores de radiodifusão ou de televisão local ou outras atividades ligadas à comunicação social; são baixos os índices de concentração da propriedade no domínio da imprensa regional; existe um clara assimetria no desenvolvimento da imprensa regional de acordo com critérios geográficos – nas regiões do interior do país com menor dinamismo económico e social, a percentagem de títulos é bem mais baixa do que no litoral; a fragilidade das empresas, motivada sobretudo pelo fraco número de leitores e pela escassez das receitas publicitárias, torna demasiadas vezes a imprensa regional dependente do poder local autárquico e da publicidade institucional.
Importa assim que o poder político não se esqueça dessa função fundamental da comunicação social.
* Secretário de Estado da Comunicação Social entre 1995 e 2002