O criminoso

Escrito por Diogo Cabrita

“Todos passam o limite e todos cometem uma delinquência, uma infração, uma transgressão, um ato culposo, um delito. E há imensos atos que não cumprem a norma, a regra, ou a lei.”

Um filho que vai preso é um estigma social. Um rapazote que atropela e foge, um acidente sem intenção, um empurrão junto da praia, um corte na veia errada, uma morte, uma família dorida, ferida, enraivecida, jurando vingança, gritando inclemência. O ladrão, o assassino, aquele a quem falharam os travões, o que desviou dinheiro alheio, o que não se conteve na ocasião. Todos passam o limite e todos cometem uma delinquência, uma infração, uma transgressão, um ato culposo, um delito. E há imensos atos que não cumprem a norma, a regra, ou a lei. Eu pecador me confesso! Eu gosto de umas transgressões na velocidade conduzida, às vezes abuso do álcool, fumei umas travessuras – coisas botânicas com cheiro acre, salpiquei os olhos de mulheres alheias, por vezes irresistíveis, outros desejos emocionais. Eu não sou puro e me entrego. Ando ali na borda da fantasia e por vezes passo a fronteira. Digo palavras mansas e marotas. Não sou contido na vozearia se me irrito. Sei que perco a razão se me empertigo.
Sou dessa toalha imensa onde cabe o criminoso. Mataria! Se matasse ia cheio de razão ou de convicção e não sei se me arrependeria. Mas podia matar por incúria, num momento incauto, num desvario, num acidente. O que distingue estas situações é o nexo de causa efeito. O problema está em que tudo é crime, é contra a lei e a moral. É delito! O delito só tem um caminho: o julgamento e depois da prova produzida, a decisão. As decisões são poucas e começa a enorme mistura: criminosos são todos os que passaram de arguidos para sentenciados. Mas há sentenças de pessoas negligentes, de doentes, de distraídos, de adormecimentos com dolo. Há tudo entre criminosos e é isso que muita gente não percebe e mesmo nas cadeias entre guardas e chefes de presídio há esta enorme confusão. Não são todos iguais. E mesmo entre iguais há uma construção diferente. Há aquele que fez uma asneira empurrado de circunstâncias brutais. Há o que se defendeu heroicamente da brutalidade alheia. Há o imbecil que é burro e só faz parvoíces. Há o deslumbrado que engaja na rede do sucesso fácil e vil. Nas cadeias também há carcereiros bons e maus. Há essa rede de diretores de cadeia que não se sabe como chegam ao lugar. Concurso não é. Curriculum parece pouco óbvio. Um dia explicar-me-ão como se alcança esse posto com salário equiparado a diretor. O “criminoso” preso existe numa rede penitenciária que precisa de reforma urgente. Demasiados polícias em funções que o não são. Parcos médicos para uma necessidade elevada. Alimentação miserável. O maior criminoso é um sistema que condena por não cumprimento da lei, mas não cumprindo depois nenhuma das regras legisladas para as cadeias.

Sobre o autor

Diogo Cabrita

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