Menos pano

“os dias que correm, com as sensibilidades sociais sempre tão à flor da pele, talvez se devesse ter em consideração que a formulação, “isto está um calor que não se aguenta, se isto continua assim, vamos todos falecer”, talvez seja um bocadinho racista com os povos dos trópicos que sempre viveram com altas temperaturas. “

Está calorzinho. Segundo os especialistas, o calor já é muito e vai ser cada vez mais. Deixo aos peritos e aos tarados a discussão sobre o efeito provocado pela humanidade e pela geologia.
Parece-me aceitável a ideia que os humanos, para se livrarem do frio, inventaram coisas para aquecer o ambiente, e que entretanto, tendo este realmente aquecido, têm vindo a inventar outras que o arrefece.
A mensagem dos catastrofistas, “vamos todos morrer em breve”, tem uma consequência óbvia, que é ficar quieto à espera do momento em que a Terra explode, que deve estar para Setembro, Outubro no máximo.
Para quem acha que o calor está pela hora da morte, mas que ainda vamos a tempo do planeta sossegar e não nos fritar vivos, a obsessão é simples: vivermos todos, com boa vontade, como os Hamish, ou, sem remissão, um regresso ao neolítico. Estes são os negacionistas do engenho humano, os que acham que a industrialização causou todos os males do tempo, mas não acreditam que a tecnologia possa ajudar a superar as dificuldades com o clima. Frigoríficos e ventoinhas, para estas cabeças, só causam mais calor, não dão mais fresquinho.
Há uma outra espécie de negacionistas, os que fingem que as temperaturas são as mesmas todos os anos, e vestem uma samarra nas tardes de Setembro com 30º com o argumento, “isto o Outono, já se sabe, pede sempre um casaquinho pela fresca”. É deixá-los transpirar. Em sua defesa, estes não pedem a ninguém que finja não estar calor, ao contrário dos anteriores, que querem obrigar o mundo inteiro a viver em cabanas de colmo.
Há também a atitude mais estúpida, mais imbecil e mais inapropriada, que por acaso é a que eu partilho, de, por mera observação, perceber que o clima está genericamente mais quente, de não fazer ideia qual seja a percentagem de culpa que se deve dividir entre o desenvolvimento humano e os ciclos geológicos, mas que ainda vai acreditando que os seres humanos, que se têm conseguido adaptar ao ambiente, às circunstâncias, com invenções e intervenções que lhes permitiu ir habitando o planeta há muitos milhares de anos, têm ainda inteligência suficiente para se safar desta – apesar das muitas provas em contrário que vamos encontrando, principalmente nas redes sociais.
Nos dias que correm, com as sensibilidades sociais sempre tão à flor da pele, talvez se devesse ter em consideração que a formulação, “isto está um calor que não se aguenta, se isto continua assim, vamos todos falecer”, talvez seja um bocadinho racista com os povos dos trópicos que sempre viveram com altas temperaturas. Podemos é aprender com as suas experiências e passar a andar de tronco nu.

* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

Sobre o autor

Nuno Amaral Jerónimo

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