Memória e liberdade de expressão

“Por “dá cá aquela palha”, por diferenças de opinião, por divergência de pensamento, os verdugos da liberdade de expressão, os ditadores, os tiranos, os déspotas e opressores atacam, agridem, maltratam, ofendem ou matam… ou vão a tribunal pedir a condenação da liberdade de opinião.”

1. O conflito entre Israel e o Hamas é um absurdo, disse José Gil, como todas as guerras são absurdas. Mata-se em nome do ódio, da vingança, da religião, da falta de respeito pelos Direitos Humanos e do direito internacional. O Hamas atacou com crueldade terrorista; Israel responde com violência bélica. Os palestinianos sofrem exilados na sua terra, numa prisão inaceitável, num conflito que nasceu há 75 anos com a fundação do Estado de Israel e que a comunidade internacional não conseguiu resolver, apesar das muitas deliberações das Nações Unidas. O ódio de gerações de palestinianos que vivem enclausurados por detrás de uma cerca é alimentado pelo terror e pelas bombas israelitas. O belicismo hebraico é legitimado pela sobrevivência de um povo sempre perseguido a quem foi outorgado o direito a viver num território bíblico que devia ser de paz e harmonia, mas vive em conflito constante.
Como muito bem sintetizou José Gil, «não é possível tomar partido por Israel em nome de valores que o Exército israelita viola todos os dias. Não é possível tomar partido pelo Hamas que mata e tortura da maneira mais cruel». Mas é possível tomar partido pela vida; é possível tomar partido pela paz; é possível tomar partido pelo direito de Israel a existir e a defender-se do terrorismo; e é possível tomar partido pelos direitos do povo palestiniano e pela existência do Estado da Palestina.
2. A liberdade de expressão é um valor absoluto que estranhamente nem sempre é devidamente defendido por quem tem a obrigação de o fazer: os tribunais e os governos (e que a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia plasma de forma muito clara no seu 11º Artigo). Por “dá cá aquela palha”, por diferenças de opinião, por divergência de pensamento, os verdugos da liberdade de expressão, os ditadores, os tiranos, os déspotas e opressores atacam, agridem, maltratam, ofendem ou matam… ou vão a tribunal pedir a condenação da liberdade de opinião. Nos jornais convivemos todos os dias com esta gente, com estes ignóbeis que querem silenciar a informação isenta e a opinião livre. Estes tiranetes recorrem a todos os meios para nos atacar e ofender, e hoje, entre as redes sociais, o medo e os receios ou o poder do dinheiro, assistimos a uma intolerável submissão das liberdades (e sem imprensa livre não há liberdade nem democracia).
A Alemanha proibiu manifestações de palestinianos, a Europa tomou posição por Israel… E Paddy Cosgrave, líder da Web Summit, escreveu que «os crimes de guerra são crimes de guerra, mesmo quando cometidos por aliados», uma opinião, uma tomada de posição contra o apoio “oficial” da Europa ao belicismo de Israel – uma evidência que levou a que Israel primeiro e multinacionais como a Google, a Meta (Facebook e Istagram) ou a Amazon decidissem anular a sua presença na próxima Web Summit: todos contra a liberdade de expressão, contra o direito de opinião de Cosgrove que teve de se demitir… para acalmar as feras!
Pouco antes, a justiça portuguesa condenou Mamadou Ba pelo crime de difamação por ter escrito nas redes sociais que Mário Machado, militante neonazi, foi «uma das figuras principais do assassinato de Alcindo Monteiro» (que foi barbaramente assassinado por um grupo de skinheads, numa noite de vários ataques racistas) – uma condenação que devia envergonhar a justiça portuguesa e a juíza, que condenou a liberdade de opinião, ao sentenciar que Mário Machado não é o autor material do homicídio… e que questionou se se pode «chamar a isso liberdade de expressão» – o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos irá esclarecê-la quando mais uma vez a justiça portuguesa for condenada por violar a liberdade de expressão.

PS: Com a colaboração do Jornal O INTERIOR, a Rádio Altitude produziu e apresentou um espetáculo memorável no passado sábado no TMG, na Guarda. O Grande Auditório, cheio, aplaudiu de pé a excelente interpretação teatral de “Guarda a Nossa Rádio”. E, depois, homenageámos António Emílio Aragonez, o radialista e voz da Rádio Altitude durante mais de 50 anos. Centenas de pessoas emocionadas, rendidas à memória da rádio, aplaudiram vigorosamente o homenageado e todos os que trabalharam e trabalham na rádio, pelo seu 75º Aniversário. Obrigado

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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