O meu título fica melhor em francês, como compreenderão pelo que segue. Refiro-me aqui aos novos conservadores, ou à nova direita, mais ou menos radical, mas que apresenta traços comuns mais ou menos generalizados (e algumas variantes).
O programa tradicional da direita de recusa de um Estado demasiado interventor, ou da exigência de menos impostos, ou ainda do conservadorismo dos costumes e da influência da religião ampliou-se nos últimos anos a outras áreas. Há já quem fale em direita libertária, por isso mais aberta em relação aos costumes e às causas que o Bloco acha “fraturantes”, mas há muito mais do que isso.
A direita deixou-se contaminar pela xenofobia, pela interpretação literal dos textos religiosos, pela demonização dos que se lhe opõem e por um espírito de “vale tudo se for para ganharmos”.
Por isso toleraram as “fake news” no referendo do Brexit e nas eleições presidenciais americanas, por isso apoiaram o muro na fronteira sul dos Estados Unidos, destinado a impedir a entrada dos migrantes dos países mais pobres da América Latina, e por isso criminalizou o governo conservador de Itália o socorro aos migrantes do Mediterrâneo, ou tratou desumanamente outro, o húngaro, os que chegaram às suas fronteiras.
Não vamos esquecer também o discurso cada vez mais agressivo contra as minorias, ou a negação das alterações climáticas, ou ainda na insistência, em regiões mais conservadoras dos Estados Unidos, em que se ensinem as ciências naturais de acordo com a Bíblia. É também aqui que se encontram os que não acreditam em vacinas (embora os haja também do lado liberal), mas creem no direito inalienável de ter armas em casa.
O problema desta amálgama de crenças, tiques e ódios é transformar tudo isto num todo coerente. Na base da Estátua da Liberdade, em Nova Iorque, o célebre poema de Emma Lazarus promete refúgio na América aos desvalidos, aos rejeitados, aos miseráveis do mundo, àqueles que mais ninguém quer. São estes, já agora, aqueles a quem o Sermão da Montanha promete esperança.
Temos assim gente que se diz fervorosamente cristã e consegue ser, ao mesmo tempo, xenófoba e intolerante. Essa gente, que radica boa parte do seu discurso e da sua estratégia política no ódio e na mentira, é tolerada pela direita democrática e inteligente, por tacticismo ou apenas por não querer ficar para trás. Seria tudo apenas triste se não estivessem a ganhar.