Há um meme popular na internet com a seguinte lição simples: jornalismo não é relatar que fulano A diz que está a chover e sicrano B diz que faz sol. Jornalismo é abrir a janela e ver a porra do tempo que faz lá fora. O jornalismo português às vezes esquece-se desta máxima, mas só quando convém que o céu não lhe caia em cima da cabeça.
Na sequência do rebentamento da barragem de Kakhovka, na Ucrânia, os jornais (especialmente os televisivos) introduziam sempre a notícia com “Kyiv e Moscovo acusam-se mutuamente da destruição da central hidroeléctrica”.
Curiosamente, nos acontecimentos do 10 de Junho, que envolveram governantes e cartazes, nunca vi a notícia ser introduzida “primeiro-ministro e professor acusam-se mutuamente”, já que à exclamação de Costa, “isso é racismo”, o manifestante retorquiu, “isso é mentira”.
Em ambos os casos, há mais um detalhe que devia contar para o trabalho do jornalista: o passado. Não é preciso ir à Torre do Tombo para descobrir quem é que tem destruído mais infra-estruturas (a Rússia com bombas, o Governo com desleixo) e quem é que habitualmente apresenta, digamos eufemisticamente, uma versão mais fantasiosa da realidade (se o leitor tem dúvidas nesta, eu ajudo: é o Kremlin e o Largo do Rato).
No caso de António Costa e dos professores, quem é que já deu mais provas de ser racista e de ser aldrabão? Esta pergunta fica para o leitor decidir sozinho, que eu gostaria de evitar tribunais, e com a rapidez da justiça em Portugal, não quero que a polícia daqui a uns anos me vá intimar ao lar de idosos por estar acusado de faltar ao respeito ao Senhor Primeiro-Ministro, ainda por cima um valoroso membro de uma comunidade étnica minoritária, que até quando visitou a Índia foi orgulhosamente apresentado como o primeiro indiano a governar um país europeu, agora acompanhado também pelo PM britânico, o tal que confunde a esquerda norte-americana por ser não-branco e conservador, mas que os britânicos, que costumam ter as prioridades mais acertadas, sabem que é de uma minoria, sim, mas a minoria dos ricaços multimilionários.
* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia