A primeira vez que deu de caras com a ideia de a escola promover a mobilidade social, lá pelo início dos anos 90 do século passado (sim, cerca de metade de si, é mesmo do século passado), terá sido pela mão de uma Ana e duas Helenas a interpretar um Bernstein. Ideia a que achou mais piada por nunca ter pensado nela, do que por ela mesma. É que aquilo fazia tanto sentido que até chocava nunca ter pensado nisso, mas continuou sem pensar. Pelo menos até começar a perceber que alguém tinha trocado a ideia de mobilidade social pela ideia do “elevador” social. Coisa que começa por ficar-lhe atrás da orelha e acaba a emaranhar-se-lhe no cérebro. Não que tivesse nada contra elevadores, ascensores e coisas assim, mas, já se sabe, que nenhuma dessas coisas anda sozinha e há muita gente que, parecendo querer ajudar, só atravanca. Começando por dizer que aquilo, o elevador, está muito cheio e acabando a empurrar a maioria dali para fora, só isso. E, pronto, fica a pensar que terá sido assim, por uma simples troca de palavras, que a escola se predispôs a deixar de ser um lugar para aprender e terá passado a ser um lugar para competir. Competir por uma classificação que permita permanecer no elevador e evitar canseiras no galgar de escadas, entenda-se. Porque, aparentemente, o “sucesso” pós-escolar, o que justificaria ter-se andado na escola, deu em morar no topo de edifícios cada vez mais altos e inacessíveis aos que nem sequer se lembrariam de a frequentar, não fora pela obrigatoriedade de o fazerem.
Supostamente, o saber nascia, crescia e reproduzia-se na escola e, apesar de só alguns parecerem estar predestinados a alcançá-lo, seria uma forma de qualquer um poder morar no topo do prédio mais alto da maior cidade. O problema é que nem o saber aí nascia e, muito menos, crescia. Ainda que a escola tenha ficado sempre muito profícua em reproduções, a certa altura, parece que deu em ficar estéril de saber. O que, como se pode imaginar, não encaixa nada em século algum e muito menos neste, em que as bibliotecas ficaram à distância do ar que se respira, os laboratórios são deixados pelo carteiro no tapete da entrada e o luxo é poder ter uma cabra no jardim. Quem não entender isto, quem continuar a defender o “rigor”, a “exigência”, a “meritocracia” da escola do seu imaginário, ou ficou preso no tempo, sem se ter apercebido, ou entre a “mobilidade” e o “elevador” social. Em qualquer dos casos, acaba por revelar mais falta de escola do que preocupação com o estado da dita. Desde logo, porque mobilidade pressuporá transferência de qualquer coisa em qualquer direção e elevador remeterá, essencialmente, para um movimento ascensível. Tudo muito bonito, e, se não fosse por esta nossa tendência biológica de nos impormos, a qualquer custo, sobre os outros, trocar “mobilidade” por “elevador” nem quereria dizer lá grande coisa. Assim, mais parece que é da possibilidade de trocar o nome às coisas, só para poder ser o dono delas, que alguns não pretenderão prescindir.
Em caso de dúvida, evite dizer “elevador…”
Começando por dizer que aquilo, o elevador, está muito cheio e acabando a empurrar a maioria dali para fora, só isso.