Como se previra, o Movimento pelo Interior foi mais uma “ação” sem consequências. Álvaro Amaro e todos os que com ele partilharam a vontade de clamar por mudanças de paradigma e de coesão do território sabiam que não era tarefa fácil. No seguimento de tantos outros, insurgiram-se contra a litoralização do Portugal democrático. Reclamaram contra as medidas e investimentos públicos constantes em Lisboa e Porto e o completo abandono do interior.
A 18 de maio de 2018 entregaram ao Presidente da República, Presidente da Assembleia da República e primeiro-ministro um extenso documento de reivindicação, identificando um conjunto de indicadores sobre os desequilíbrios do país e algumas medidas que poderiam contribuir para a coesão territorial.
Três anos depois, o Movimento constatou o óbvio (Público, de 17 de maio) que não foram ouvidos, que nada mudou de essencial «para contrariar o paradigma do abandono dos territórios do interior e da falta de confiança para o investimento». Uma deceção, portanto. A mesma deceção que outros, tantos outros, sentimos ao tentar reivindicar mudanças na política centralista e centralizadora que o país tem promovido. Passado o “barulho das luzes” nada de substantivo foi feito – e este Movimento, por mérito próprio, conseguiu algum ruído mediático. E confirmou-se que no Terreiro do Paço só se alcança o que está à vista. O Portugal distante e atrasado está muito longe. Demasiado para se pensar nele.
Num tempo em que mais de 60% da população reside na faixa costeira, que quase três milhões de pessoas vivem na área metropolitana de Lisboa e quase dois milhões na região do Porto, ou seja, quase metade da população portuguesa, percebemos que «não há país que se possa desenvolver na base de tão gritantes desigualdades».
Por honestidade, devemos regozijar-nos com algumas medidas pontuais que foram tomadas nos últimos tempos e não podemos ignorar que a pandemia adiou ou bloqueou algumas outras. Mas, por serem tão pontuais e espúrias, não podem desculpar a falta de políticas de fundo, de opções estratégicas, de investimentos estruturantes, de projetos e ideias determinantes para estancar o despovoamento e desertificação que a maioria do território português sofre há dezenas de anos e de forma exponencial nos tempos mais recentes. Sim, porque se o êxodo rural é ancestral, a litoralização e despovoamento dos territórios de baixa densidade teve uma espiral extraordinária nos últimos anos: «82,4% da população com menos de 25 anos reside no litoral, enquanto no interior só vivem 17,6%; o litoral recebe 89% das dormidas turísticas e tem 89% dos alunos no ensino superior»… Esta é a realidade, e não é com paliativos que se pode mudar estruturalmente uma região, quanto mais um país. «As desigualdades são um sério obstáculo ao desenvolvimento, à consagração do princípio constitucional da igualdade de oportunidades e à justiça social». O Movimento pelo Interior fez o que pôde. Fez pouco, como tantos outros, porque a verdade é que a ditadura da democracia (os votos) está no litoral e não é fácil fazer mais do que reivindicar sem sucesso… E este é o último momento de nos fazermos ouvir, enquanto os filhos e netos dos que partiram das nossas terras, de Trás-os-Montes, das Beiras ou do Alentejo, ainda estão emocionalmente ligados à terra dos antepassados e pela sua afetividade vão defendendo o interior como destino de investimentos públicos. Mas todos se esquecem que as mudanças têm de ter um carater estrutural, deviam ter acontecido pela regionalização sempre adiada a favor da centralização administrativa, económica e cultural. Não basta dizer que defendemos «a nossa terra» ou mobilizarmo-nos em grupos de cidadãos, porque por muita razão que tenhamos a força só se consegue de forma contínua e centrifuga envolvendo todos. Com mais «radicalismo» e sem deixar adormecer a exigência da correção das muitas assimetrias que espoliaram o futuro das nossas terras. Com movimentos ou sem eles, nestas eleições devemos exigir um compromisso pela nossa região, porque muito mais importante do que defender uma piscina «na vila» ou o saneamento básico «na aldeia» urge defender políticas regionais que deem futuro às cidades do interior, porque se as nossas cidades se desenvolverem e crescerem serão boas para nós e para os nossos filhos (inclusive para os que legitimamente escolhem viver nos mais pequenos lugares ou aldeias da região).
Defender as cidades do interior
porque mais importante do que defender uma piscina «na vila» ou o saneamento básico «na aldeia» urge defender políticas regionais que deem futuro às cidades do interior, porque se as nossas cidades se desenvolverem e crescerem serão boas para nós e para os nossos filhos