A requalificação do Centro Histórico da Guarda é, há muitos anos, um desiderato dos guardenses, uma promessa adiada e uma obrigação estratégica que demora a ser concretizada.
No final do século passado, e em especial durante as comemorações dos 800 anos do Foral da cidade, houve alguns sinais, ideias e projetos para recuperar a zona velha da Guarda (como a requalificação dos antigos Paços de Concelho, que albergou durante alguns anos a Mediateca) ou a instalação do GAT (e depois os SMAS) em S. Vicente. Posteriormente, houve vários programas de apoio para a recuperação das casas devolutas, para as fachadas, as portas, as janelas, etc, mas, entre a inércia da autarquia e o desinteresse generalizado, a cidadela foi morrendo. Com o programa Polis houve mais uma oportunidade para devolver a vida a S. Vicente e qualificar toda a cidade, mas a zona com menor sucesso na intervenção foi precisamente o Centro Histórico – as de sucesso foram a do Parque Urbano do Rio Diz e a construção do novo quartel dos Bombeiros, com o desmantelamento do antigo (para onde foi projetada a instalação da “estação” do “monorail”, com que se pretendia ligar a Estação ao centro da cidade e que, infelizmente, não avançou).
Em 2006, a Câmara da Guarda avançou com mais um projeto ambicioso de reabilitação para a zona histórica, nomeadamente para a zona do Torreão, o Paço do Biu ou a antiga judiaria. Foi mais um passo para recuperar o tempo perdido e o abandono inconcebível a que a cidade votara a sua mais preciosa e antiga área urbana. Com muitas polémicas pelo meio, foi então iniciada a requalificação do espaço público, em especial o pavimento e a Praça Velha, também alguns espaços de lazer, mas tudo de forma lenta e sem a continuidade necessária – os proprietários privados ficaram sentados a assistir e nada fizeram pela recuperação das suas casas devolutas e em ruína; a autarquia foi incapaz de perceber e definir uma matriz que envolvesse todos na recuperação de casas e a revitalização de espaços sociais e culturais. A requalificação da Praça Velha (ou Luiz de Camões ou da Sé) foi um desastre quase irrecuperável e a pavimentação das ruas e ruelas uma melhoria sem continuidade. Em vez de se reabilitarem as muralhas, limpando, instalando uma iluminação cénica e um passeio superior, como tantos reivindicámos, e pondo-a à vista de todos, manteve-se grande parte da muralha de origem medieval escondida por casas e estruturas, escura, abandonada e sem dignidade, e permitindo a construção de um centro comercial nas suas imediações, escondendo-a, eliminando os seus imensos horizontes e ocupando com betão uma encosta que deveria estar limpa. Os anos foram passando e as intervenções pontuais sucederam-se, sem estratégia e sem ambição – a reabilitação da Igreja de S. Vicente foi a única intervenção de qualidade. Depois chegou Álvaro Amaro com a promessa de uma grande intervenção no “quarteirão das artes”, que nunca aconteceu (neste momento está a ser reabilitado o telhado do Paço da Cultura e Centro Cultural enquanto as janelas apodrecem…), mas foram ganhos alguns pontos na renovação do Centro Histórico: a instalação do elevador panorâmico que permite acesso ao extraordinário miradouro da Torre dos Ferreiros e o respetivo pavimento (polémico, mas acertado), a entrega do desprezado “quintal medroso” à CVRBI e a construção (polémica, mas aceitável e bem contextualizada) da sua sede e centro de provas. E a instalação da sede da CIMBSE nos antigos Paços de Concelho (uma conquista de Álvaro Amaro) – a CIMBSE está ainda numa fase de afirmação, lenta, e que será determinante para o futuro da Guarda e região; as instalações, hoje exíguas, irão ser ampliadas para os dois imóveis laterais que a Câmara adquiriu e que estão vergonhosamente em ruínas na Praça Velha, que serão finalmente reabilitadas.
Defendi aqui, muitas vezes, o investimento público no Centro Histórico da Guarda, com a aquisição de casas, que devem ser reabilitadas, para instalar residências de estudantes (que agora todos sabemos que fazem muita falta à cidade), para albergar residências artísticas, para instalar oficinas de arte e cultura (devia ser ali instalado o SIAC durante todo o ano), para ceder a jovens e a associações, para recuperar o projeto da instalação do Centro de Interpretação da Judiaria Medieval, para dar vida a S. Vicente. Por isso, o anúncio da aquisição do edifício do antigo Teatro Egitaniense pela autarquia é uma excelente notícia. O imóvel tem dimensão para um excelente aproveitamento e contribuir decisivamente para alavancar vitalidade a S. Vicente e contribuir para um novo passo na reabilitação do Centro Histórico da Guarda (queriam um parque de estacionamento no Centro Histórico? Pois aqui têm um excelente siloauto). Esperemos que esta seja mais uma oportunidade e que seja bem aproveitada. A Câmara deve adquirir mais casas e promover S. Vicente como bairro de residência jovem, de atividade cultural e dinamização artística.
Dar vida ao Centro Histórico
“as instalações da CIM irão ser ampliadas para os dois imóveis laterais, que a Câmara adquiriu e que estão vergonhosamente em ruínas na Praça Velha”