Colonização interna

Escrito por António Ferreira

Se pensarmos na taxa de ocupação do território de Hong Kong ou da faixa de Gaza comparada com a nossa, concluiremos que o nosso país tem muito espaço livre. A perceção não é essa, já que a população se mostra concentrada à beira das estradas e dos rios e não é fácil andar muitos quilómetros sem avistar vestígios de ocupação humana. A vista aérea, contudo, mostra outra realidade, em Portugal e pelo mundo fora. Por isso dizem muitos dos que negam a influência humana nas alterações climáticas que a nossa influência, como espécie, nas condições do planeta é muito inferior à que a nossa vaidade pensa. Seja, mas mesmo assim não deixam de ser impressionantes as imagens do planeta à noite e a evidência, pelas luzes, da nossa presença.

Há sítios com menos luzes, muito menos, e as aldeias, vilas e cidades do interior de Portugal são um exemplo. Uma cidade como a Guarda pode dar a aparência de ter muitos habitantes, mas um passeio à noite pelas ruas dos bairros periféricos mostra que são muitas as casas fechadas e sem sinal de vida. Na minha rua, por exemplo, são várias.

Parece assim boa ideia oferecer-se um prémio para quem queira vir viver para o interior. Esse prémio, que no máximo fica ainda assim abaixo de 5.000 euros, é que não parece suficiente para convencer muitos a mudar de vida. Só na mudança, na caução de uma renda de casa e nas primeiras impressões o dinheiro vai gastar-se. Depois haverá que conseguir emprego e, aí, começam as desilusões: apesar de haver alguma oferta de emprego, poucos são os que oferecem algo mais que o salário mínimo.

Mesmo assim, da nova economia digital pode resultar um fenómeno migratório interessante. Muita gente está cansada da vida nas cidades grandes e para trabalhar precisa apenas de uma ligação à Internet. Há muita gente, pelo mundo fora, a procurar casa em áreas rurais e a fazer aí a sua base. Procuram segurança, ausência de poluição, tranquilidade, menos tempo no tráfego, em geral menos stress.

O problema é que vão procurar também boas escolas e bons hospitais – e estas são condições eliminatórias. Vão querer também deslocar-se com frequência a Lisboa ou ao Porto, e não vão querer gastar em portagens o que pouparem em rendas de casa Aproveitarão de certeza os benefícios fiscais que lhes derem.
Mesmo dando tudo isso de barato, continuo com a ideia de sempre: é muito bom convencermos a vir para cá gente em idade de trabalhar e ter filhos, mas pergunto-me se tem sido feito o suficiente para convencer os que cá estão a não irem embora.

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António Ferreira

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