Junho ficou marcado pelos resultados do projeto-piloto da semana de 4 dias, lançado em 2023 pelo Governo do Partido Socialista, no âmbito da Agenda do Trabalho Digno.
É hoje evidente que as regiões e os países disputam entre si a capacidade de atração e de fixação de talento. É o maior fator crítico de sucesso de uma região e de um país. Por isso, a Agenda do Trabalho Digno, que entrou em vigor no 1º de Maio de 2023, procurou criar instrumentos para posicionar Portugal na liga dos primeiros desta competição global.
Tratou-se da mais profunda alteração das leis e das políticas ativas do trabalho, após a ampla discussão e reflexão do Livro Verde do Futuro do Trabalho. O resultado deste diálogo foi uma agenda progressista, voltada para o futuro, que tem medidas estratégicas para, de uma forma integrada, responder a enormes desafios:
Valorização dos Jovens no mundo do trabalho (com medidas de apoio a contratos permanentes para os jovens, com salários adequados às qualificações, e com estágios obrigatoriamente pagos, por exemplo),
Regulação do trabalho remoto e novas formas de trabalho, como enorme oportunidade de atrair jovens para o interior;
Criação de rede de espaços de co-working no interior;
Programa de incentivos para trabalhar no interior;
Programa Regressar, de incentivo para retorno dos emigrantes portugueses;
Novas licenças parentais para promover real partilha entre mulheres e homens;
Novos instrumentos para a conciliação da vida pessoal, familiar e profissional.
Foi neste contexto que lançámos, em 2023, o projeto-piloto da semana de 4 dias para testar e avaliar novas formas de organização do trabalho e de promoção da conciliação.
A adesão das empresas e dos trabalhadores foi voluntária. Participaram 41 empresas de todo o país e mais de mil trabalhadores. Os setores foram vários: indústria, comércio, educação, consultoria, ciência, tecnologia, ação social e até uma creche. Uma curiosidade: a maioria das empresas que participaram são lideradas por mulheres.
As empresas tiveram apoio técnico e formação suportada pelo IEFP e acompanhamento por parte dos professores Pedro Gomes e Rita Fontinha, que coordenaram o projeto-piloto, sempre em articulação com a minha equipa no Ministério.
Em cada uma das organizações foi definido o modelo de implementação adaptado a cada uma das empresas, acordado com os trabalhadores.
Houve em média uma redução de 13% do horário de trabalho, sem diminuição do salário (o que era, aliás, pressuposto do projeto).
Resultados? Ficaram demonstradas, de forma evidente, as vantagens de novas formas de organização de trabalho focadas na valorização e na satisfação dos trabalhadores, com impactos diretos na sua motivação, disponibilidade, inovação e produtividade.
Naturalmente, são adaptações exigentes, que exigem planeamento, avaliação e customização, mas os resultados extremamente positivos ultrapassam largamente as dificuldades.
A implementação da semana de 4 dias implicou na maioria das situações reorganização de processos, diminuição de tempo em reuniões, reformulação de sistemas informáticos, criação de automatismos, novos blocos de trabalho e de turnos.
Da parte das empresas, todas avaliaram positivamente o projeto, destacando a sua importância no contexto das relações laborais em Portugal, bem como as melhorias operacionais e de desempenho dos trabalhadores. Prova disto é que a maioria das empresas participantes (38 das 41) decidiu, aliás, não voltar ao modelo que tinha anteriormente.
Da parte dos trabalhadores, constatou-se uma evidente redução da exaustão e desgaste, melhoria da saúde mental e física, melhor equilíbrio entre trabalho e vida pessoal e aumento da satisfação, sobretudo, com o tempo livre. Em média, os trabalhadores equipararam a semana de 4 dias a um aumento de 28% no salário!
Os resultados do projeto-piloto mostram que temos de permanentemente responder aos novos desafios das expetativas e das necessidades dos trabalhadores e que os modelos que sempre assumimos como os normais devem ser questionados para irmos mais longe.
Hoje damos como adquiridas muitas das conquistas do mundo do Trabalho, sem pensarmos nas dúvidas e nas inquietações – e até contestação – que geraram. As mudanças – mesmo quando evidentes – demoram e têm de ser aceleradas.
Novas formas de organização de trabalho são essenciais para atrair talento, num mundo em que os jovens têm cada vez mais opções e poder de decisão sobre as condições de trabalho que mais respondem às suas expectativas de vida e de realização. A conciliação da vida pessoal com a vida profissional, a liberdade e a mobilidade são os fatores críticos para os novos trabalhadores.
O projeto-piloto da semana de 4 dias é um salto de gigante que demostra que é possível reorganizarmos o tempo de trabalho, melhorando a qualidade de vida e aumentando a produtividade. É neste contexto que o interior tem, como nunca, a possibilidade de se posicionar como um espaço de oportunidades de equilíbrio entre qualidade de vida e o trabalho que o litoral claramente não tem.
Trabalhadores com qualidade de vida, com tempo para si, são trabalhadores criativos, produtivos, inovadores – e podem ser a alma do interior. E as empresas que fazem dos trabalhadores a sua alma crescem mais e melhor. Por isso, este projeto-piloto tem de ser uma base de aprendizagem para os próximos saltos necessários, nomeadamente incentivos para acelerar estas mudanças decisivas, adaptadas a cada realidade – sem preconceitos.
Estas mudanças precisam de verdadeiras parcerias entre as organizações, os trabalhadores e o Estado – que tem de ser um motor e não um mero espetador. É preciso dar mais asas e não parar esta missão de garantir mais vida com melhor trabalho e interior com mais vida!
* Deputada do PS na Assembleia da República eleita pelo círculo da Guarda