Assistindo ao debate às legislativas referente ao círculo eleitoral da Guarda e perante propostas e discursos neoliberais dos candidatos, que visam incutir que os impostos são injustos, sobretudo sobre o capital e o trabalho, ninguém tocou nos pressupostos da injustiça fiscal, e sobretudo a evasão fiscal, na ordem dos 24 mil milhões de euros e que supera a contribuição direta e indireta do PRR. A injeção de mais de 3 mil milhões numa empresa que nunca deveria ter saído da esfera pública não pode apagar no discurso neoliberal o que já contribuímos para os agiotas financeiros e bancos privados – na ordem dos 18 mil milhões de euros – e ainda contribuímos para um chamado fundo de resolução que deveria ser financiado pelos acionistas dos bancos e não pelos contribuintes.
Saliento que a existência de um sistema solidário com as contribuições dos trabalhadores e das empresas (em resultado do produzido pelos trabalhadores) ao sistema público de Segurança Social, universal e solidário, é um instrumento insubstituível de promoção de justiça social na distribuição do rendimento nacional a todos os portugueses e que permitiu debelar problemas decorrentes da pandemia e obviar diversas situações graves em termos sociais.
Este sistema público, universal e solidário concretiza as suas finalidades através do regime contributivo, do regime não contributivo e da ação social, desempenhando estas diferentes modalidades uma função complementar entre si que permite estender a proteção social a um conjunto mais vasto de eventualidades e de situações de risco, daí que não devemos entender como um imposto, mas sobretudo como uma contribuição para o primado da solidariedade social entre gerações de trabalhadores.
O sistema previdencial, ou contributivo, assente na solidariedade profissional e intergeracional, visa assegurar prestações substitutivas de rendimentos perdidos em situações como a doença, desemprego, parentalidade, invalidez, velhice e morte. O sistema de proteção social de cidadania, ou não contributivo, assente na solidariedade nacional, visa garantir direitos básicos dos cidadãos.
À conivência do bloco central político do PS/PSD, com apoio do CDS, juntam-se hoje a Iniciativa Liberal (IL) e o Chega, apoiantes indefetíveis do que se passou entre 2010 e 2015, período em que o sistema público foi sujeito pela política de direita a um acelerado processo de fragilização que reduziu o direito à Segurança Social, corroeu a sua base de financiamento, promoveu o conflito de gerações e estereótipos sobre os beneficiários, sendo particularmente visados as pessoas idosas, os desempregados e os beneficiários de prestações sociais não contributivas. Estou à vontade para defender muitos idosos que sempre lutaram e trabalharam para que seus filhos estudassem e singrassem na vida, neste quadro enalteço a minha mãe. A solidariedade entre trabalhadores implica a visão de esclarecimento e mobilização de classe. Escolher os nossos aliados é fundamental para um futuro melhor.
Na verdade, não podemos branquear as responsabilidades políticas do governo minoritário do PS, onde se inclui a primeira candidata do PS pelo circulo eleitoral da Guarda e que tem a responsabilidade da área do Trabalho e Segurança Social, mas é fundamental relembrar o governo PSD/CDS que procurou aproveitar a oportunidade para implementar o seu projeto programático de transformar o sistema público de Segurança Social, universal e solidário num sistema público residual, assistencialista, minimalista e assente na seletividade na atribuição do conjunto de prestações sociais – lembrem-se dos 600 milhões previstos nos cortes das pensões.
É necessário ter em conta os fatores económicos e de distribuição da riqueza entre o capital e o trabalho. E, nestes domínios, está muito longe de estar devidamente potenciado o aumento de receitas para o regime previdencial resultantes da valorização dos salários e do salário mínimo nacional. Aliás, este foi um dos três pontos sobre o qual o PS se manteve inflexível na cedência à proposta do PCP a favor dos trabalhadores para aumento em janeiro de 2022 para 755 euros e não os 705 euros, infelizmente a parte dos salários e ordenados no PIB é cada vez mais reduzida. Saliento que este governo minoritário do PS, com a contribuição do PSD/CDS/IL/CH, roubou 206 euros/mês na devida e justa progressão salarial aos mais de 20.000 enfermeiros, sendo que uma parte seria para impostos (IRS, IVA, ISP e outros) e outra para a contribuição da Segurança social.
O compromisso do PCP para com a reposição de rendimentos e direitos de Segurança Social, que naturalmente implicam o aumento de despesa, é acompanhado por propostas que visam o aprofundamento do financiamento deste sistema público. Para o PCP, a discussão sobre a sustentabilidade da Segurança Social é bastante pertinente e absolutamente necessária. Uma discussão que não nega os impactos dos fatores demográficos. Contudo, eles não podem ser instrumentalizados, nem tão pouco absolutizados. As quebras de natalidade e o aumento da população idosa não podem legitimar políticas de redução de direitos de Segurança Social. O declínio demográfico é um problema do país. São, pois, necessárias medidas integradas que promovam os rendimentos e a sua estabilidade, melhorando as expectativas das pessoas quanto ao futuro; que reforcem os direitos dos trabalhadores ao longo do ciclo de vida; que apoiem a conciliação família-trabalho, sendo um ponto crítico o aumento da taxa de cobertura dos equipamentos e serviços dirigidos à infância, mais uma área de intervenção estratégica do PCP ao longo dos anos, neste sentido o reforço da CDU – PCP/PEV permitirá levar por diante na correlação de forças na Assembleia da República.
* Militante do PCP