P – Qual é o objetivo da Rewilding Portugal no Grande Vale do Côa?
R – A Rewilding Portugal quer tornar o Grande Vale do Côa um lugar mais selvagem, tornando este território um corredor natural funcional, onde as pessoas e a natureza coexistem de forma sustentável a longo prazo. A Rewilding Portugal acredita que a natureza, quando valorizada, pode trazer novas oportunidades para o desenvolvimento económico de comunidades rurais (desde turismo da natureza até à produção de produtos regionais de alta qualidade) que podem dinamizar esta região e ajudar a reverter a tendência socioeconómica do interior de forma sustentável.
P – O que está previsto fazer?
R – Queremos criar novas pequenas reservas ao longo do Vale do Côa, semelhantes à Reserva da Faia Brava em Figueira de Castelo Rodrigo, que valorizam o património natural e protegem a sua biodiversidade. O pastoreio natural com cavalos garranos ou sorraias é outra das ações que a organização quer desenvolver para promover a limpeza de biomassa e restaurar cadeias tróficas mais completas na paisagem. Para promover estas cadeias tróficas completas o projeto também está a monitorizar o comportamento e hábitos alimentares de aves necrófagas, e quer criar uma rede de explorações agrícolas em que os agricultores possam deixar os cadáveres dos seus animais domésticos num local específico da exploração (não tendo de enterrar os animais ou chamar o SIRCA). Outro dos objetivos é promover a coexistência com o lobo ibérico, trabalhando de perto com os criadores de gado para melhorar a proteção do gado doméstico, e assegurar que há presas silvestres suficientes na área para o lobo ibérico se alimentar. A Rewilding Portugal está neste momento a implementar um programa de cães de gado em que criadores de gado interessados podem entrar em contacto com a organização caso estejam interessados em adquirir um cão de gado, e receber apoio na alimentação e educação do cão.
P – Com que apoios conta? E que dificuldades estão a encontrar?
R – A Rewilding Europe está a liderar o projeto “Promover a Renaturalização do Grande Vale do Côa”, financiado pelo Endangered Landscapes Programme. A Rewilding Portugal, Universidade de Aveiro, ATNatureza e Zoo Logical são os outros parceiros deste projeto, que ao longo dos próximos anos vai reforçar o corredor de vida selvagem que é o Vale do Côa através das medidas já mencionadas.
P – Qual é a marca/ ação que pretendem deixar no território?
R – A longo prazo, queremos que o Grande Vale do Côa seja um lugar mais selvagem, com ecossistemas coerentes em pleno funcionamento e abundante vida selvagem. Um lugar onde processos naturais e cadeias tróficas completas desempenham papéis fundamentais na regeneração da paisagem. Esta marca define um território abrangente e a marca fundamental é que, na perceção do público geral, seja relevante o peso de uma paisagem natural deste território. A vida selvagem já retornou partes da área, com espécies como o lobo ibérico, veado-vermelho e corço que continuam a expandir a sua área de distribuição. Queremos também construir uma economia baseada na natureza e na cultura para criar apoio comunitário que suporte um ambiente mais selvagem, no qual os processos naturais e a vida selvagem modelam a paisagem.
P – Até agora, já foram surpreendidos, no bom ou no mau sentido, com alguma situação com que não estivessem a contar no Grande Vale do Côa?
R – A presença de corço ao longo do Grande Vale do Côa foi uma surpresa positiva. A equipa do projeto pensava que o corço ainda era uma espécie relativamente rara, mas o trabalho de campo que tem sido feito revelou que é mais comum do que pensávamos. Isso é um bom sinal para a área, e pode também ajudar a promover a coexistência com o lobo ibérico, uma espécie de presença irregular no Grande Vale do Côa, e que precisa de presas silvestres em abundância para a sua alimentação. Se existirem estas presas silvestres (que também incluem o veado e o javali) e o gado doméstico estiver bem protegido, é possível diminuir o número de prejuízos causados por lobo ibérico a criadores de gado na região.
Perfil de Pedro Prata:
Líder de equipa da Rewilding Portugal no Grande Vale do Côa
Idade: 38 anos
Profissão: Diretor da Rewilding Portugal
Currículo (resumido): Formado em Biologia com mestrado em Conservação e Ecologia e Evolução; Trabalhou em vários projetos de conservação no Brasil, Estados Unidos e Caraíbas; Está envolvido em organizações de ambiente e natureza. Foi diretor da ATN até 2018 e é fundador e atual diretor da Rewilding Portugal.
Livro preferido: Leitor compulsivo, não sendo o preferido recentemente ficou impressionado com “The Empathic Civilazation” de Jeremy Frikin, sobre uma visão do mundo agora baralhada com o impacto da Covid-19
Filme preferido: a comédia italiana de Riccardo Milanni, “Come un gatto tangenciale”, disponível na plataforma Filmin.pt
Hobbies: Desportos de natureza e agricultura de pequena escala.