Cara a Cara

«Ainda temos muitos tubistas a ensinar eufónio»

Escrito por Jornal O INTERIOR

Entrevista a Mauro Martins, Eufonista

P – Vai lançar o seu primeiro álbum, que é também o primeiro de eufónio solo lançado em Portugal. O que motivou este projeto?
R – A própria carreira já estava a pedir um álbum. Eu dou bastantes masterclasses e faço recitais em vários continentes. Por exemplo, estive há pouco tempo num festival na China, no Festival Internacional de Tuba-Eufónio da Ásia, e já estive na América algumas vezes, na Europa em vários países… e as pessoas queriam sempre – a seguir aos meus recitais – um CD. Queriam levar aquele CD, gostavam do concerto e queriam uma recordação para poderem ouvir mais vezes e realmente eu não tinha. E embora seja cedo, decidi fazer este projeto e tive a sorte de contar com uma equipa que realmente era a que eu queria, tanto a nível de convidados, como produtor, designer… E correu tudo como eu queria a esse nível, o que facilitou tudo. E claro, tive a sorte de ter o apoio das marcas que me patrocinam (e das quais sou artista), como a Adams, uma marca de instrumentos holandesa; a Denis Wick, que é uma marca inglesa e uma marca japonesa, de bocais, a Brass Lab Momo. Também o município de Celorico da Beira me apoiou neste projeto e me facilitou tudo, deixou o meu trabalho mais facilitado e mais livre para poder escolher os músicos e a forma como tudo era feito de forma mais livre e desafogada.

P – Referiu essa questão do apoio de marcas internacionais. Este CD é também uma forma de promover a música a solo deste instrumento em Portugal?
R – Sim, sem dúvida.

P – Tendo em conta que é um instrumento cuja formação ainda está muito ligada à tuba, e a outros instrumentos de sopro, este trabalho pode ser um marco na música portuguesa, no sentido de promover uma formação mais autónoma?
R – Sim, sim, sem dúvida. É um projeto que reforça não só a qualidade, mas a importância do eufónio no seu estado mais puro. Ainda temos muitos tubistas, muitos professores de tuba, a ensinar o instrumento, mas realmente devia ser maior a aposta nos professores de eufónio, principalmente nas escolas profissionais e nas universidades. É importante termos realmente o curso de eufónio que ainda não há em muitas universidades (penso que há só numa). Porque, por exemplo, eu tirei o meu curso – tanto na universidade, como na EPABI – e os meus dois diplomas são diplomas de tuba, nem são de eufónio. E sim, espero reforçar o valor do nosso instrumento e mostrar que já temos qualidade que chegue, não só no meu caso, mas em muitos outros. A classe está a crescer a nível nacional e internacional e temos de dar a importância devida a isso de forma a que tenhamos um professor de eufónio, realmente, a lecionar tanto a nível superior como a nível de mestrado e de doutoramento. E penso que o CD é um bom passo para isso. Já a nível da história da música, nunca deixará de ser um marco nisso mesmo porque será o primeiro CD de eufónio em Portugal.

P – Como define o seu trabalho que está materializado neste CD?
R – Neste CD quis trespassar um pouco do espelho que eu sou, mesmo no nome do CD. O que tentei explicar e mostrar foi exatamente um espelho do início da minha carreira. Ou seja, só por termos música que vai desde Ravel até Daniel Bernardes – que é uma linguagem jazzística e depois uma linguagem mais clássica, que é uma coisa completamente diferente –, é um CD em que procurei muito que fosse eclético e não exatamente apenas de um só tipo de música e de um tipo de linguagem. Também tive a sorte de ter alguns compositores e obras que ainda não tinham sido gravadas. A maior parte são obras portuguesas e que marcaram também o meu percurso de alguma forma. Tenho tocado muitas delas em recitais e masterclasses que tenho feito pelo mundo, são obras que penso que me definem tanto como músico e como eufonista. E acho que não sendo obras tão, digamos, padrão do nosso instrumento – tem obras também para clarinete baixo da Anne Vitorino de Almeida e a “Habanera”, de Ravel, que é para voz, e as obras todas que gravei que foram escritas para eufónio – são obras que vêm enriquecer um pouco o nosso reportório. Algumas delas fui eu que as toquei pela primeira vez. Também tenho uma obra – que foi outra coisa que gostei de deixar a marca no CD – de dois jovens compositores, com cerca de 20 anos cada um. Eles escreveram em conjunto uma composição que me é dedicada e também gostei de dar a oportunidade a alguém que eu sei que tem nível e qualidade e para estar também neste projeto.

P-Ou seja quis dar a oportunidade a novos compositores?

R-Exatamente.

P-E quais foram os maiores desafios que enfrentou durante este trabalho?

R-O maior desafio sem dúvida alguma que foi o coronavírus. Porque nós começamos em fevereiro e depois o projeto parou cerca de três, quatro meses. Foi necessário retomar tudo novamente e as primeiras coisas que pensei foi organizar tudo a nível monetário. Ter os músicos que eu queria, ter o produtor que eu realmente queria e sim, tive a sorte de, mesmo com o coronavírus nenhuma marca e nenhum apoio me ter sido retirado. Todos quiseram continuar, todos quiseram apostar nesse CD porque era algo também que não era só eu que queria, as marcas também me pediam e claro que queriam promover com este CD o próprio nome. Sim, sem dúvida que [o maior desafio] foi o coronavírus, porque parámos. Parámos os ensaios, parámos as gravações…e penso que podiam ter sido muito mais preocupações mas devido a esta equipa tão ágil tudo foi realmente fácil e foi uma experiência incrível. Agora estou à espera já de fazer o próximo e ainda mal saiu o primeiro [risos].

P-Para quando será o esse próximo?

R-É assim, eu vou agora vou entrar num projeto que também é a gravação de um CD mas não é meu. É um projeto diferente, que ainda não se pode contar tudo mas será um projeto em que eu vou gravar algumas obras de um compositor, com um dos meus convidados que é o Sérgio Carolino que foi também meu professor na universidade e uma inspiração. Talvez o [meu próximo CD] seja um projeto de duo, também ainda não se pode dizer muito. Talvez no final deste ano início do próximo… É ver como as coisas vão agora também com esta nova realidade, que esperemos que dure pouco. 

P-Na sua tenra idade já tem um currículo bastante vasto. Qual é o seu próximo objetivo? O que ambiciona conseguir alcançar?

R- É assim objetivos eu muitos e sonhos então, eu tenho milhões. Mas eu acho que o mais importante para mim é não perder esta vontade de aprender e talvez o meu próximo objetivo musical – ou seja de aprendizagem – seria entrar mais por uma nova linguagem. Talvez aprender um pouco de jazz. Acho que vai complementar [o meu trabalho] e ajudar-me.

Perfil:

Mauro Martins

Eufonista

Idade: 25 anos

Naturalidade: Celorico da Beira

Currículo: Formado em sopros e percussão na EPABI e licenciado pela ESMAE – Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (Porto). Conquistou o 1º Prémio no concurso internacional de sopros “Terras de La Salette” (Oliveira de Azeméis), nas categorias Júnior (2014) e Sénior (2015); e em 2019 o 1º prémio no Concours International de Saxhorn, Euphonium and Tuba, de Tours (França). Realiza frequentemente concertos e leciona masterclasses nos continentes europeu, asiático e americano

Livro preferido: “Ansiedade – Como enfrentar o mal do século” de Augusto Cury

Filme preferido: Não tem

Hobbies: Ler e praticar desporto

Sobre o autor

Jornal O INTERIOR

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