Riscos e rabiscos, frutas ou ervas aromáticas, mãos ou corpos delineados a carvão ou a lápis de várias cores. Os morangos são vermelhos e têm um sabor diferente. Há um mês, 12 “artistas” internadas na Casa de Saúde Bento Menni, na Guarda, pensavam que não sabiam desenhar, mas com o segundo capítulo do “Inside Out” acabaram por projectar nos desenhos algo do seu interior e a forma como cada uma vê o mundo. O resultado está à vista numa exposição patente no “foyer” do pequeno auditório do Teatro Municipal da Guarda até ao final do mês.
«A arte pode funcionar como uma importante terapia para algumas utentes», sublinha Carla Costa, psicóloga clínica da Casa de Saúde Bento Menni, que acompanhou de perto este trabalho desenvolvido pela artista plástica Maria Lino. Durante o mês de Maio, duas vezes por semana, o grupo «fugiu à rotina» durante duas horas e aprendeu a arte do desenho, adianta, admitindo que houve alguma resistência no início: «Elas perguntavam o que iam lá fazer se não sabiam desenhar», recorda a psicóloga. Mas, com o tempo, esse preconceito foi-se perdendo, até porque começaram a perceber que o que desenhavam era apreciado. «É raro haver oportunidades como esta», garante Carla Costa, para quem o apoio de Maria Lino foi fundamental, pois fez com que «acreditassem nos seus trabalhos e isso fá-las sentir valorizadas na sua auto-estima». Houve trabalhos individuais e colectivos, «o que foi muito importante, já que perceberam que podiam dar o seu contributo para o mesmo trabalho», refere. Quanto aos trabalhos, acabaram por projectar «algo do seu interior e a forma como cada uma vê o mundo», sublinha Carla Costa.
Já para Maria Lino foi «uma experiência magnífica, que devia continuar». Tanto mais que a experiência não foi difícil: «Ignorei o sítio onde estava e tentei ver um grupo de mulheres que iam trabalhar comigo, independentemente de terem alguma doença ou não», explica. Mas como nem todas as doentes conseguem articular palavras, a artista plástica teve que procurar o «diálogo possível» através do desenho. Por isso, ao longo de um mês, Maria Lino tentou transmitir-lhes a necessidade de ver e sentir. «Levava coisas diferentes para cada sessão, plantas aromáticas, fruta, hortaliça, entre outras. Elas perguntavam o nome e cheiravam», lembra. No final da inauguração, na passada sexta-feira, a “professora” estava visivelmente orgulhosa do resultado final: «Fizeram desenhos muito lindos, que não têm nada haver com doenças», garante. O “Inside Out” é um projecto de intervenção cultural promovido pelo TMG e aconteceu pela segunda vez, sendo que o primeiro realizou-se no Centro Educativo do Mondego e o próximo será desenvolvido na Aldeia SOS. «O mais importante não é a exposição, mas como se chegou até aqui», destaca o director artístico do TMG. Para Américo Rodrigues, o objectivo do “Inside Out” «é criar um relacionamento do TMG com um público esquecido e estigmatizado».
Patrícia Correia