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Recursos financeiros I

Vox Populi

Atrevo-me a abordar a questão financeira da Câmara Municipal da Guarda sem o acesso prévio e quase obrigatório, quer do Plano quer do Orçamento para 2006, onde obviamente vão ser espelhadas as preocupações políticas e as soluções que o novo executivo vai propor para responder ao maior constrangimento que se coloca à gestão da nossa Câmara.

O atrevimento não é grande dado os antecedentes (conhecimento atento da situação de partida) e porque, quanto à matéria, prometo regressar logo que os citados documentos estejam disponíveis, com uma análise já das opções tomadas. A situação não é de facto nada fácil, porque o enorme peso da dívida de curto prazo no total da mesma (cerca de 50 milhões de euros – 10 milhões de contos), ultrapassa os 50 por cento, sendo estranguladora da saúde financeira de qualquer instituição. Se acrescentarmos a esta realidade o facto do total da dívida corresponder quase ao total da receita bruta de dois anos de exercício, então poderemos afirmar que as “boas práticas” são impossíveis e as soluções devem ser radicais.

O espaço de uma legislatura não é tempo suficiente para apenas actuar no lado da despesa. Estando atento às várias intervenções públicas do sr. presidente da Câmara, fácil é concluir – e parece-me ser de reconhecer – que da preocupação manifestada durante a campanha eleitoral, passou agora a delinear uma estratégia com bom diagnóstico, mas… com um sentido ainda algo titubeante no que a soluções diz respeito. É de facto este “mas” que pretendo esclarecer como contributo para as soluções possíveis e não mais que isso.

Parecem-me claramente insuficientes as medidas apontadas, já que o objectivo primeiro nas afirmações produzidas para esta área são «o saneamento financeiro» (veja-se entrevista a este jornal de 24/11). Não bastará fazer cortes na despesa, como nos subsídios, desinvestindo nalgumas áreas, como a cultura (aqui só q.b.), racionalizando serviços, (bem nas iluminações de Natal, mal na continuidade das “horas extraordinárias”), principalmente porque o quadro envolvente apresenta no mínimo as seguintes condicionantes:

1 – Capacidade de individamento zero – face à Lei de Enquadramento Orçamental, que se sobrepõe à conhecida Lei das Finanças Locais.

2 – Um PIDAC pobre em valores, mas ainda mais nas obras (falta delas) “estruturantes” e de “qualidade de vida” para o concelho

3 – Um projecto de PLIE com défice de capital, principalmente face à estratégia delineada de ser mais público do que privado. São necessários mais de 10 milhões de euros só para a primeira fase infraestrutural, que não corresponde ainda a 50 por cento do total da área do projecto. O compromisso já anunciado de ampliá-la se quisermos receber projectos de investimento da dimensão da Citröen, só vai aumentar essa necessidade.

4 – Uma dívida dos Serviços Municipalizados enorme e que não pára de crescer, principalmente à empresa Águas do Zêzere e Côa (aqui deixo a recomendação de tentar a revisão do contrato, como, aliás, repetidas vezes fiz proposta no executivo anterior)

5 – Um conjunto de obras em execução a necessitarem de ser terminadas que absorverão mais de 5 milhões de euros. E isto se colocarem de lado o projecto claramente megalómano de ampliação/reclassificação do Hotel Turismo, onde teriam que mobilizar mais de 10 milhões de euros, embora em parte financiáveis pelo Fundo de Turismo.

6 – Uma estrutura de recursos humanos sobredimensionada que, enquanto não reorganizada e capacitada para melhores eficiências, será um custo demasiado elevado para a quantidade e qualidade de serviço prestado.

Assim, ou se consegue uma realização extraordinária e volumosa de capital (a ideia de Joaquim Canotilho de alienar ou realizar um “leasback” através da empresa Hotel Turismo poderia ser uma delas), ou será inviável fazer o anunciado saneamento financeiro neste mandato. E a situação económica do país condiciona e muito as soluções que nem a conhecida relação pessoal com o primeiro-ministro poderá facilmente vir em nosso socorro.

E as finanças locais – leia-se fornecedores da Câmara – bem precisam de uma injecção de dinheiro fresco de alguma monta, até para permitirem no próximo futuro melhores receitas para a Câmara. É hora de planear e bem o nosso futuro colectivo, e este sem o reequilibrio financeiro da autarquia estará fortemente comprometido. Ao executivo fica o desafio de, envolvendo preferencialmente a oposição, criar condições para um Plano e Orçamento 2006 que nos surpreenda pela positiva. Aguardo com alguma expectativa.

Por: J. L. Crespo de Carvalho

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