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«Quero realizar um filme quando tiver algo de novo a dizer»

Cara a Cara – Entrevista

P – Como surgiu a oportunidade de trabalhar no filme “Lost in Art – Looking for Wittgenstein”, recentemente exibido no festival IndieLisboa?

R – A possibilidade de montar esta curta-metragem surgiu quando estava a trabalhar na montagem do documentário “Blind Runner”, de Luís Alves de Matos, sobre o artista plástico João Louro. A determinada altura decidiu-se realizar uma curta com algum do material existente em Super 8, filmado inicialmente para o documentário, onde seria possível experimentar e expressar ideias com maior liberdade.

P – Foi a primeira vez que fez a montagem de um filme?

R – Não. Terminei o curso de cinema na Escola Superior de Teatro e Cinema (ESTC) em Setembro do ano passado e, desde essa altura, participei na montagem da longa-metragem “Goodnight Irene”, do realizador Paolo Marinou-Blanco, para a produtora Filmes do Tejo e no documentário “Os Edifícios – 13 Testemunhos” para a Fundação Calouste Gulbenkian. Mas nos três anos que frequentei a ESTC já tinha montado várias curtas-metragens, até porque esta instituição aposta numa forte componente prática, já que todos os anos se realizam vários filmes, filmados em película e que funcionam de uma forma muito semelhante ao que se faz a nível profissional. Os alunos apresentam projectos que são mais tarde avaliados. Inicialmente, cada um é apresentado e defendido por três alunos (produtor, realizador e argumentista). Esta primeira fase envolve cerca de 12 projectos, dos quais apenas seis passam à fase seguinte, quando o trabalho, já mais desenvolvido, irá englobar directores de som e fotografia, assistentes de realização e produção. No final, somente três projectos serão concretizados e exibidos mais tarde em festivais de cinema.

P – O filme recebeu alguma distinção?

R – Não. Embora tenha sido bem recebido por algumas pessoas que nos fizeram chegar as suas opiniões, não foi um dos preferidos do júri do festival. No entanto, foi um dos filmes seleccionados para as extensões que o Indie Lisboa tem por hábito fazer, sendo novamente exibido em Paris e no Centro Cultural da Malaposta.

P – Qual a temática do filme? O que retrata?

R – É um daqueles filmes que perde alguma da sua força quando desvendado ou explicado ao público antes de este o poder ver. É aberto a várias leituras, dependendo muito da visão que cada um tem sobre o mundo actual e da capacidade de leitura do espectador das várias pistas que lhe são lançadas. “Lost in Art” é, no fundo, a procura de uma resposta a várias questões que o mundo absurdo de hoje nos coloca. Uma procura que é feita através da arte, por já não ser possível acreditar que a salvação virá da política ou da religião, pois o seu prazo de validade parece já ter sido ultrapassado.

P – Quais são os seus próximos projectos nesta área?

R – Neste momento retomei a montagem do documentário “Blind Runner”, que deverá ficar pronto até ao Verão. Num futuro próximo tenciono concluir alguns projectos pessoais na área da ficção e do documentário.

P – Está nos seus horizontes realizar um filme?

R – Julgo ser o sonho, ou objectivo, de qualquer pessoa ligada ao cinema. Para além de ter participado na montagem de vários filmes quando estive na ESTC, tive a sorte de ter conseguido também realizar duas curtas-metragens e foi das experiências mais fantásticas que tive. Actualmente não me sinto, de todo, frustrado na montagem, pois é uma das áreas do cinema mais fascinantes, mas obviamente que um dia gostaria de ter a oportunidade de realizar os meus próprios projectos. No entanto, fazem-se tantos filmes hoje em dia que considero ser fundamental que qualquer pessoa que decida realizar um filme tenha realmente algo de novo ou importante a dizer. Quando sentir isso em mim tentarei concerteza a minha sorte.

P – Como e quando é que começou a sentir este gosto pelo cinema?

R – Parte da “culpa” é do antigo Cine Clube da Beira Interior. E falo em antigo porque, para mim, o CCBI de hoje nada tem a ver com esse cine clube que me permitiu conhecer filmes que mudaram a minha forma de encarar o cinema. Acho bastante triste que, numa cidade como a Covilhã, cuja universidade tem um curso de Cinema, não se consigam ver com regularidade bons filmes. Também houve filmes que surgiram em momentos-chave da minha vida e que me levaram a encarar o cinema não apenas como forma de entretenimento. Ter visto “Eraserhead”, de David Lynch, com 16 ou 17 anos, fez-me perceber que o cinema poderia ser muito mais do que contar uma história com princípio, meio e fim. Poucos anos depois foi “O Acossado”, do Godard. Aí pensei de imediato que, afinal, os filmes antigos também podem ser grandes filmes. Foi o abrir de uma porta que me levou ao melhor do cinema, que hoje em dia apenas uma minoria parece ter curiosidade em conhecer. Ao terminar o liceu, ainda cheguei a fazer um “workshop” em Lisboa e trabalhado numa curta-metragem do Edgar Pêra, mas na altura não segui esse caminho. Acabei por tirar um curso de Jornalismo, trabalhar nessa área durante algum tempo e só depois cheguei à conclusão que o cinema era aquilo que realmente queria.

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