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Portugal à deriva (a partir de um texto “fechado”)

Bilhete Postal

«Era uma jangada que se desprendia ali dos Pirenéus e arrancava “mar adentro”, como o som forte dos “Héroes del Silencio”. Portugal governado por si só neste encanto, não como a cegueira de Saramago, colocava a vela no mastro e seguia rumo à América distante. Íamos sem remos e sem leme com a certeza de que lá chegaríamos. Portugal voado por cartoons como Valérian, agente espácio-temporal (série de banda desenhada franco-belga de ficção científica escrita por Pierre Christin, desenhada por Jean-Claude Mézières e colorida por Évelyne Tranlé. Valérian adaptado ao cinema pelo incrível Luc Besson (cineasta de “Léon le profissionel”, “Os Cinco Elementos”) jamais deixaria de nos visitar quando invadidos pelas figuras do “La planète de l’angoisse” do incrível Luc Oriente de Eddy Paape. Portugal visitado por personagens que voam, que estão carregadas de tecnologia de ponta e se abatem sobre os tiranos das instituições. As “cidades obscuras” de Schuiten e Peeters, entre as quais colocamos “Equador City”, de E. Bilal, nos seus permanentes 21º negativos. É um Portugal cheio de referências como se fosse a biblioteca mundial, a luz do quinto império do Padre António Vieira até Fernando Pessoa. A ideia de um Portugal menino que será grande outra vez e por isso parte em edificação e ensino com a sabedoria e depois a criatividade que a torna universalista».

Já ninguém me segue neste texto, já fui abandonado pelos leitores. O problema dos textos cultos que vêm carregados de referências e ausência de fantasia é exactamente este. Afogo-me na minha esfera de prazeres e saberes, embrenho-me num destino hermético até que vou completamente isolado na sua busca. O destino de uma construção edificada de referências é a solidão e o silêncio. Mas esses textos também são pedras basilares da humanidade. Vem isto a propósito dos subsídios estatais às coisas que ninguém vai ver, a peças de cultura que nem consigo entender. Isto é válido para a ciência também. A cultura intimista e conceptualizada de suportes intelectuais com referências não acessíveis a todos constrói soluções por vezes tão disparatadas ou desorientadas que nos afastam no imediato. Apoiar? Sim? Não? Havendo folga de dinheiro vou pelo “talvez!” mas construídos os critérios coerentes da dádiva.

Por: Diogo Cabrita

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