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Pinguins

Corta!

Depois dos ursos de Grizzly Man, e dos coelhos de Wallace & Gromit, a que se fez aqui referência na passada semana, a presença de animais continua esta semana em alta nos ecrãs de cinema nacionais, e é agora chegada a vez dos pinguins, com a estreia entre nós de A Marcha dos Pinguins.

Enorme sucesso em França, país de origem deste documentário, e verdadeiro fenómeno nos Estados Unidos, onde é já o segundo documentário mais visto de sempre naquele país (o panfletário Michael Moore com Fahrenheit 9/11 ocupa o primeiro posto), A Marcha dos Pinguins estreia em Portugal de forma discreta. Com pouca ou nenhuma promoção, dificilmente se repetirá em Portugal o sucesso que este filme teve noutros países.

Não é difícil perceber os motivos que levaram a tal sucesso. Para além do pinguim ser um animal bastante simpático à maioria das pessoas, com um ar castiço e movimentos engraçados, os pinguins imperadores, aqui retratados, são o que de mais romântico se possa imaginar. A história de amor entre DiCaprio e Kate Winslet, em Titanic, comparada com a destes animais, é do mais banal que se consiga imaginar. E os ingredientes para um bom romance, com drama e boas doses de suspense, estão lá todos. Com o trunfo de serem reais e não saídos da cabeça de alguém. A realidade quase sempre supera a ficção, conseguindo ser mais imaginativa e surpreendente. Já para não falar da veracidade de tudo aquilo a que assistimos. Aqui: uma morte é uma morte.

As imagens são belas e o documentário está repleto de momentos de cortar a respiração, alguns dignos de Hitchcock. Quando, uma vez por ano, os pinguins deixam o oceano e percorrem dezenas de quilómetros para acasalar, aventura começa. Em fila indiana, pelo deserto branco e inóspito da Antárctica, o pinguim vai ultrapassando todos os obstáculos que se lhe deparam. Não são poucos, nem fáceis. Com imagens e acontecimentos tão belos e grandiosos, poderia ter sido evitada a forma como as vozes humanas são aqui usadas. Três vozes para três pinguins. O macho, a fêmea e a cria. Por entre tiradas poéticas que se perdem totalmente perante a grandeza das imagens que estas acompanham, e diálogos que servem apenas para retirar alguma da graciosidade e nobreza de todos os gestos deste animal, A Marcha dos Pinguins, ou pelo menos a sua versão original, francesa, que foi escolhida para estrear por cá, peca pela sua tentativa de criar à força personagens dignas de um qualquer filme Disney. No filme, tudo começa bem e acaba melhor. A palavra morte é evitada e mesmo que os momentos mais duros não sejam escondidos, nota-se sempre algum pudor quando estes são mostrados. Um filme que se quer de família, portanto. E na verdade não vem grande mal ao mundo por isso. Mas para quem o não queira ir ver em família, talvez se revelasse mais interessante a versão americana que conta apenas com a voz de Morgan Freeman. Por estranho que possa parecer, os americanos desta vez não desejaram infantilizar um filme que tem tudo para que isso seja possível.

O sucesso do filme não é realmente obra do acaso. Quase todos os filmes, desde sempre, têm em si uma história de amor, mesmo nos filmes mais improváveis, sejam eles de ficção científica, de cowboys ou terror. É disso que na realidade as pessoas gostam, mesmo que tais histórias precisem vir tantas vezes com embrulho diferente. Apenas para disfarçar. Para quem goste das tais histórias de amor, este é um filme a não perder.

O Corta! regressa em Dezembro.

Por: Hugo Sousa

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