Acabamos de saber que a Coreia do Norte realizou um teste nuclear subterrâneo, o terceiro, fazendo explodir uma bomba com cerca de metade da potência da deflagrada em Hiroshima há sessenta anos. O acto foi geralmente condenado e mesmo pelos aliados tradicionais da Coreia do Norte, como foi o caso da China, ou dos países que mais lhe toleram estes comportamentos, como seja a Rússia. O objectivo do teste foi exclusivamente militar e vem na sequência de declarações provocatórias e crescentemente agressivas dos responsáveis do país. Sabendo-se da miséria que aí grassa, da fome que levou à morte milhões de pessoas, este teste militar parece totalmente falho de sentido e merecer o repúdio de toda a humanidade civilizada.
Não sei se Bernardino Soares, o mesmo do célebre “não tenho a certeza de que a Coreia do Norte não seja uma democracia”, pertencerá a esta categoria. Tenho pelo menos o mesmo direito que ele a exprimir esta dúvida, e sobretudo quando se sentiu obrigado a notar que a comunidade internacional tem sobre o tema dois pesos e duas medidas.
Deveria Bernardino esclarecer estas enigmáticas declarações, sobretudo considerando que não há recentes notícias de ensaios nucleares de outros países, que o Irão ainda não chegou lá (e esperemos, quando isso acontecer, pela reacção do PC), e por isso faltam termos de comparação para apreciar as contradições da comunidade internacional.
Poderão dizer que se referia ao arsenal nuclear israelita, mas já não há memória aqui de um ensaio nuclear e é injusto comparar as situações: Israel está muito mais ameaçado e por ameaças bem mais reais do que o paranóico regime norte-coreano.
Não há nada de surpreendente naquela atitude, vinda de quem lastimou a morte de Kim Jong Il e recusou um voto de pesar quando morreu Vaclav Havel. Proponho um pequeno exercício: conhecendo-se a obra e a vida de um e outro, se tivéssemos de valorar Bernardino Soares e o seu partido pela sua preferência em relação a estes dois homens e àquilo que representam, a que conclusão chegaríamos?
Há preferências que tanto podem vir da teimosia e do sectarismo como de algo mais fundo, e isso é inquietante. É que não dá para entender a simpatia que o PC insiste em manifestar para com um dos regimes mais repelentes do nosso tempo, a não ser que seja para o indicar como modelo a seguir e, com tanta insistência sobre o assunto, acabará por nos convencer de que é essa a ideia.
Por: António Ferreira