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Os capatazes

Editorial

1. A propósito da privatização da TAP o governo está a mostrar a sua pior face. Em primeiro lugar, uma completa cegueira em nome de uma suposta convicção que vai muito para além do interesse económico e empresarial, e não tem em consideração a mais-valia cultural e social da extraordinária bandeira nacional que é a companhia aérea. A nove meses do fim da legislatura, este governo devia evitar a tomada de decisão de vender a única grande empresa que nos resta sem um acordo tácito com o maior partido da oposição e nunca vender por «adjudicação direta». E, mesmo que a atual coligação ganhe a próximas eleições (possibilidade inadmissível neste momento para todos os leitores, mas que, depois do verão, se verá…) o governo deve reconsiderar o seu plano de venda da transportadora aérea e, isso sim, vender ou encerrar a empresa de manutenção que tem no Brasil (TAP E&M) que é um verdadeiro buraco e que põe em causa o futuro da TAP – tem havido muitos pruridos em falar do assunto para evitar que os brasileiros se irritem, mas os prejuízos acumulados impedem a companhia aérea de investir em novos aviões. Uma opinião pública informada e resiliente é a única esperança para parar um processo que, na senda de todos os outros similares, da PT à Cimpor, tem tudo para correr mal e prejudicar gravemente o país.

2. Outra face, ainda mais sombria, identificada neste processo foi a relutância de alguns governantes em negociar com alguns sindicatos; pior, a sensação de vingança evidenciada por Pires de Lima ao pretender excluir da proteção aos trabalhadores, face a eventuais despedimentos, aqueles que fizeram greve. O ministro foi mesmo ao ponto de afirmar que, «não podemos estender esse acordo a sindicatos que não se quiseram sentar à mesa e que não assinaram o acordo de paz social relativo a esta privatização» numa posição prepotente e inaceitável num Estado de Direito.

Claro que esta forma de “mandar” não é exclusiva de António Pires de Lima e do seu secretário de Estado, é a forma como cada vez mais “chefes” se outorgam o direto de mandar com base na chantagem e na calhandrice – «quem não quer… a porta é a serventia da casa!»…

A crise e o desemprego, as dificuldades e a precariedade, criam estes pequenos monstros, que andam por aí, pelo dirigismo público e pela atividade privada – não querem saber se o trabalhador é produtivo, diligente ou competente, o seu desiderato é impor a sua ordem e autoridade. Vivemos tempos difíceis, e mais difíceis para aqueles que têm de conviver com “chefes” que não têm mais horizontes que ser uns capatazes do despotismo ignorante e vil.

Luis Baptista-Martins

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