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O passivo, a Maria e o Valente

Pois, Pois

O passivo de mais de 40 milhões de Euros herdado por Valente não nasceu ontem, nem caiu do céu. Não é preciso escavar até aos mandatos de Abílio Curto para encontrar uma explicação. A explicação imediata vem do tempo de Maria do Carmo Borges. Maria do Carmo, como qualquer autarca que se preze, queria fazer obra que se visse, que desse nas vistas, queria deixar qualquer coisa para a posteridade. Este país está cheio de plaquinhas a dizer que no dia tal Sua Excelência o ministro não sei das quantas e Sua Excelência o Presidente da Câmara inauguraram esta “obra”. Às vezes, até dão o nome do presidente, ainda vivo e em exercício, à coisa. Este espectáculo triste tem pelo menos uma vantagem: quem quiser fazer um dia o levantamento do desperdício de dinheiros públicos perpetrado pelos autarcas indígenas tem apenas de seguir as plaquinhas.

Maria do Carmo nunca se pareceu incomodar muito com coisas prosaicas como os passeios esburacados (isto quando havia passeios), as estradas municipais esburacadas, o património a cair aos bocados, e o caos urbanístico. Sem um projecto consistente, e andando ao sabor dos ventos, queria sempre para a Guarda a última extravagância da moda: casinos, campos de golfe, estádios municipais, centros culturais, etc. Felizmente, não conseguiu avançar com muitas das suas brilhantes “ideias” – verdade seja dita, pelo menos uma vez acertou em cheio: na Plataforma Logística.

Numa palavra, o passivo não chegou onde chegou por acaso. Valente, em vez de denunciar em tempo útil esta situação e apontar a origem do problema, chutou, do alto da sua inconsciência, para canto. Agora, é ele quem tem o menino nos braços, e é a ele que vão pedir contas. De maneira que o homem é uma espécie de bombeiro involuntário, que entrou em cena com o alarme ligado e a casa já a arder. Basicamente, tem andado a atirar água para um lado e para o outro, feito uma barata tonta, sem saber muito bem o que fazer e sem resultados que se vejam.

E, no entanto, o discurso de Valente, como se pode comprovar na entrevista que dá no Boletim Municipal, até revela algum bom senso. Ele diz que quer estabilizar as finanças e “reorganizar, modernizar e requalificar os serviços que a Câmara Municipal presta”. É nestas prioridades que se devia concentrar e nas tais coisas prosaicas que referi acima, de modo a tornar a Guarda uma cidade atractiva para viver e investir. Mas o homem não se fica por aqui: quer dar “sequência à conclusão de projectos” que vêm de trás (PLIE, Biblioteca, Polis, requalificação do centro histórico), quer apostar no “turismo ambiental e de saúde”, criar “novos centros educativos”, ser amigo das criancinhas, ajudar os velhinhos, uma “cidade da saúde”, uma Plataforma Logística “dinamizadora económica da região”, quer que a Guarda seja “uma referência em termos culturais”, “desporto para todos” e, pelos vistos, ainda não desistiu do Museu da Água – curiosamente, sobre o Guarda Mall, nem uma palavra.

Moral da história: Não admira que os resultados sejam escassos. Quando as prioridades são muitas, acabam por se anular umas às outras. Pelos vistos, Valente ainda não percebeu bem o significado de gerir em economia de escassez e, por consequência, da necessidade de fazer opções claras.

Por: José Carlos Alexandre

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