O homem do leme é um Homem de pulso. É (quase) sempre escolhido entre os mais antigos pois conhece bem as marés, os vícios do navio, sabe ler as cartas, olhar pelo binóculo utilizando convenientemente a rosa-dos-ventos, o quadrante, a balestilha, o anemómetro. À sua volta vivem e convivem escaladores, parte cabeças, garfeiros, passadores de sal que tão bem sabem utilizar a rede, o anzol, as gigas, as chumbadas e as cagarras.
O homem do leme, ciente da sua enorme missão, utiliza a inteligência, o conhecimento, a destreza, a força, para poder manobrar, fazendo com que o barco corte as ondas, deixando de bater a estibordo, governando assim o destino de todos os tripulantes com dignidade, honra e elevado sentido de responsabilidade.
O homem do leme tem de saber dialogar com escaladores e garfeiros do porão. Tem de estar presente, não pode comportar-se de forma irresponsável, anos a fio, onde a cor clubística, a experiência enviesada, a falta de carácter só podem ser considerados perigos de gravidade extrema, revelando-se assim risco máximo (quase) fatal para todos os ocupantes.
O homem do leme tem de saber avaliar as consequências quando o navio encalha, que ao encafuar a proa numa rocha imprevisível, fruto do inevitável espesso nevoeiro matinal, quantas vezes impregnado dum bafio rançoso, vindo de uma poluição existente, dessa maresia muito perto da costa, aconselhando e orientando a saída para os botes salva vidas, nem que para isso tenha de trautear o tema dos Xutos, tão bem conhecido de todos nós: «E uma vontade de rir/nasce do fundo do ser/ E uma vontade de ir/ correr o mundo e partir/A vida é sempre a perder», para depois concluir «Do fundo do horizonte/Sopra um murmúrio/para onde vai/Do fundo do tempo/Foge o futuro. É tarde demais».
Perceber, em definitivo, quais são as verdadeiras forças em presença e em ação é de crucial importância. Olhar para os potenciais candidatos a Homem do leme é absolutamente indispensável. A reflexão, o bom senso, a capacidade de diálogo, de intervenção, de conhecimento dos mares, de todos os mares, das marés, das múltiplas marés, é, só por si, o melhor de todos os fatores, percebendo-se que neste apoio inequívoco ao nosso regime republicano, semiparlamentar e semipresidencial, somos obrigados a dar esse grande sinal que o futuro Homem do leme não pode nem deve ser apenas e tão só um trolaró falante, que julga de tudo saber, ao mesmo tempo que teremos de demonstrar que a República centenária ainda existe, fazendo jus ao espírito que norteou o 5 de outubro de 1910: capaz, dialogante e atuante.
Por: Albino Bárbara