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O colapso do Estado

Opinião

Semanas depois da tragédia que roubou a vida a 64 pessoas e feriu outras 200, sabemos que muitas morreram queimadas nos seus carros quatro horas depois do início do incêndio porque a estrada não fora encerrada. Sabemos que o Governo está por detrás de uma manipulação informativa, em que a Policia Judiciária aparece como protagonista, que nos quis fazer crer que tudo tivera origem numa trovoada seca. Sabemos que o sistema de comunicações de emergência (SIRESP) não funcionou durante horas e que o plano B, as duas carrinhas compradas por 400 mil euros, de nada servem por não disporem de antenas. Sabemos que o Estado nada fez para evitar o saque das casas. Sabemos que os cadáveres foram transportados num camião de peixe. Sabemos que um bombeiro ferido demorou 10 horas para receber assistência médica. Sabemos que a coordenação distrital da Proteção Civil foi desmantelada nos últimos tempos. Estamos longe de saber tudo, mas sabemos o mais importante. Sabemos que 64 pessoas foram abandonadas pelo Estado. Sabemos que no momento em que mais dele precisavam, o Estado simplesmente não estava lá.

Portugal chorou, Portugal está ainda numa “espécie de luto” em que se recusa a aceitar que tanta gente possa ter morrido de forma tão assustadora. Pelos políticos dos mais altos cargos da nação foi dito que “cada coisa teria seu tempo”, mas não está fora de tempo dizer que há coisas que nem só o tempo pode explicar. Não podemos aceitar que o tempo passe e com ele as perguntas fiquem sem resposta. O fogo mais mortífero em Portugal, um dos piores do mundo, não pode ser branqueado. Não pode haver responsabilidade apenas para as boas notícias e nunca para as más notícias. Até lá, assinale-se que, perante uma das maiores tragédias da nossa democracia, os portugueses voltaram a mostrar que são um povo solidário e a ministra da Administração Interna revelou, uma e outra vez, toda a sua insegurança e incapacidade em dar respostas.

Há que saber porque houve alterações nos órgãos de coordenação a meses de período eleitoral. É preciso saber o que falhou na resposta dos sistemas de saúde e segurança.

Ainda as dívidas aos bombeiros

O Governo veio admitir que fechou o ano de 2016 com uma dívida a corporações de bombeiros de 7,12 milhões de euros relativa a “transporte de doentes.” A informação é do Ministério da Saúde que – em resposta a uma pergunta de deputados do PSD que agora chegou ao Parlamento – adianta que a 23 de dezembro de 2016 (um dia depois dos sociais-democratas enviarem a pergunta) foi ordenado, em despacho, o pagamento de 3.329.713 euros a 23 entidades. Ainda assim, a 31 de dezembro a dívida ainda era superior a sete milhões de euros.

O problema, senhor ministro da Saúde, é que já não são só 7 milhões de euros!

A 31 de maio de 2017 eram já cerca de 30 milhões de euros. Só no distrito da Guarda é cerca de um milhão de euros, no de Viseu dois milhões e por aí fora.

Uma vergonha! Como poderá haver operacionalidade e respostas adequadas com estas faltas no mais elementar, como, haver dinheiro para pagar salários ou pagar o gasóleo dos veículos?!?

Casa roubada

O jornal “El Español” divulgou durante a madrugada de domingo uma lista completa do material bélico roubado dos paióis de Tancos. O Exército Português tinha optado por não divulgar a lista para não prejudicar a investigação mas o jornal espanhol teve acesso à informação e publicou não só o tipo de equipamento roubado, mas também as quantidades. Assustador, diga-se!

Como é possível que depois de uma situação desta natureza, aquilo que ocorra ao ministro da Defesa dizer seja apenas que este tipo de roubo «não será para coisa boa»!?

Será que este tipo de roubo de armamento não se traduzirá numa ameaça e poderá vir a transformar-se numa nova tragédia, se aquele material de guerra vier a ser usado em atos terroristas, como se teme?

Dúvidas não restarão que também aqui o Estado falhou, falhou outra vez, na segurança e na proteção, a primeira das suas funções e missões. Será talvez agora a altura de colocar as “trancas na porta”!?

Engano

Quando tomou posse, o Governo prometeu integrar nos quadros da administração pública, sem exceção, todos os trabalhadores precários. Nunca disse como ia casar essa sua intenção com o compromisso assumido perante a União Europeia de emagrecer o número de funcionários públicos. Por essa razão, já tinha afirmado que alguém iria ser enganado. Iludidos os sindicatos, sabe-se agora que o Governo enganou também 80 mil pessoas, tantas quanto aquelas que quer deixar de fora do processo de regularização.

Por: Ângela Guerra*

* Deputada do PSD na Assembleia da República eleita pelo círculo da Guarda e presidente da Assembleia Municipal de Pinhel

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