O cinema ambiental voltou a invadir Seia de 11 a 18 de outubro, naquela que foi a 20ª edição do festival internacional Cine Eco. Lá pude encontrar várias surpresas agradáveis como “A Mãe e o Mar” (2013), sobre as mulheres “pescadeiras” de Vila Chã, ou “Serra Pelada, a Lenda da Montanha de Ouro” (2013), uma viagem até ao passado e presente dos garimpeiros de uma das grandes riquezas mineiras do Brasil. Porém, na crónica desta semana vou falar-vos de “Unplugged”/“Anplagd” (2013), um documentário realizado pelo sérvio Mladen Kovacevic.
Os sons estão nas pequenas coisas do dia-a-dia, mas há muito que nos habituámos a associá-los, em particular enquanto música, aos instrumentos e à eletrónica. No entanto, o documentário sérvio surpreende pela abordagem de um instrumento nada usual: a folha. É através do sopro (que envolve uma técnica aparentemente complicada), que os participantes do filme visitam a música, num contacto direto com o que de mais puro e simples a natureza tem para oferecer. A câmara é um acessório na descoberta feita entre pessoas, que trocam dicas na descoberta dos sons guardados a sete chaves pela natureza, com o toque a despertar potencialidades sonoras que, provavelmente, desconhecíamos.
Há o inventor de instrumentos que tem dificuldade em acertar nas notas, mas que procura fazê-lo através de conversas e incursões com os “folhistas”. Há o operador de câmara que, exterior àquela que seria a realidade fílmica, se envolve com os participantes do documentário, trocando ideias e procurando desvendar, mais uma vez, os segredos escondidos pelas folhas. Há, também, uma nova natureza à espreita: feita de potencialidades e capacidades tão simples mas, ao mesmo tempo, tão complexas. Tocar uma folha não é fácil e exige a dedicação e a aprendizagem de tantos outros instrumentos. Acertar as notas parece um pesadelo, encontrar a folha ideal uma utopia, mas, apesar das dificuldades, estes músicos da natureza não desanimam e fazem-se ouvir pelos campos da Sérvia.
Quantas vezes olhamos a natureza julgando que a conhecemos? Que conhecemos os seus materiais, as suas manias, o seu potencial? E, julgando isto tudo, quantas vezes somos surpreendidos? É também esta uma das funções do cinema: levar-nos a redescobrir a nossa realidade e o que nos rodeia. Não será de estranhar que, depois de vermos “Unplugged” (2013), tenhamos a tentação de tocar em folhas – apenas para confirmar a dificuldade em ouvir o seu “canto”…
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Sara Quelhas*
*Mestranda em Estudos Fílmicos e da Imagem (Mestrado em Estudos Artísticos) na Universidade de Coimbra